Quantas coisas podem mudar em apenas um ano?

Flores desabrocham e murcham. A lua muda sua forma mais vezes do que as pessoas costumam contar. Crianças nascem, adolescentes são moldados, adultos são oficializados e idosos são retirados das vidas árduas. Uma pessoa se apaixona e outra quebra o coração. Alguém sorri com alegria, outra chora de tristeza. Os muros ficam descascados. A grama cresce e é cortada. Os ramos das árvores se estendem, derrubam folhas e são podados. A chuva cai. O sol racha. O vento uiva. As flores sorriem. As pessoas se conhecem e se despedem. Caminhos se cruzam e caminhos são cruzados. Pessoas vivem intensamente cada dia como se fosse o último. E o último dia de alguém inevitavelmente se torna realidade.

No último ano, muitos últimos dias foram criados.

Cada vez mais as viagens entre vilas se transformaram em cenários de terror. Todas com o mesmo cenário macabro deixado para trás; os corpos abandonados com corvos bicando entre os olhos atrás de carniça e uma mesma mensagem, de novo e de novo. Vítimas das mais variadas. Jovens começando carreiras militares, velhos comerciantes acostumados com as viagens, aprendizes de carroceiros, adestradores de cavalos. Todos encontravam o mesmo fim.

Ao longo dos primeiros meses, as vilas tentaram usar rotas alternativas. As viagens levariam mais tempo, porém, teriam mais segurança. E, no começo, resolveu. Conseguiram criar novas estratégias de vendas. As mercadorias saíam e chegavam recriando a conexão mercantil entre nações, os acordos tão importantes que foram essenciais para manter a paz e prosperidade entre as maiores vilas e países do mundo. Contudo, o fim sempre chega.

Não havia mais rotas seguras. Todas elas eram tomadas por viajantes que nunca mais retornavam. Em pouco tempo, os preços dos produtos dobraram. Encomendas inteiras eram perdidas, o preço dos chás e ervas medicinais foram os primeiros a sofrer com o aumento. Depois, os tecidos, carnes, legumes e até mesmo peixes que eram iguarias. Os moradores das vilas foram os mais afetados, precisando economizar para comprar o mínimo necessário para sobreviver.

Aos ninjas sobraram missões muito mais perigosas. Escoltas simples, que antes colocavam até mesmo genins para realizar, tornaram-se cada vez mais altas, sendo indicado apenas aos ninjas de cargos mais altos das vilas. Mesmo assim, não era o suficiente e uma grande parcela de falhas ocorreram. Depois de alguns meses, os potenciais militares das vilas ficaram desestruturados. Os ninjas de cargos baixos se tornaram mais numerosos – e em algumas vilas os únicos existentes. As missões aumentaram os valores, cobrando mais dos comerciantes, retendo mais para as vilas, dando mais aos ninjas para arriscarem suas vidas.

Cada vez menos viagens foram realizadas. A alta nos custos para um mero ninja colocado na escolta tornou inviável realizar as mesmas semanais do passado. Viajar sozinhos como alguns costumavam fazer também era inviável, pois, era um atestado de óbito entregue na saída da vila. Graças a isso, os preços que estavam dobrados logo ficaram quatro, cinco, até seis vezes mais caros.

Cada vila tinha um plano diferente para auxiliar os moradores, mas em nenhuma delas as coisas estavam fáceis. Eram pessoas cada vez mais pobres e desesperadas. Assaltos tornaram-se comuns, a fome também. Ninjas cada vez mais sobrecarregados com diversas missões desde vigiar as ruas até escoltar carroças com medo de não retornarem mais. Em alguns lugares, tornou-se comum escrever um testamento antes de cada missão realizada fora dos limites da vila.

Para muitos, o fim já estava ali.

O vento acertou os cabelos de Terukami, empurrando-os para trás. Aquele horizonte diante dele estava marcado por nuvens densas, carregadas pela tempestade aguardada por ele há tantos anos. A tormenta de mudanças que daria fim àquela era. Ajeitou os óculos, o cheiro da chuva se aproximando sobre o oceano o convidou para sorrir, mas ele conteve à vontade. Virou-se batendo o manto-sobretudo no ar, tinha informações importantes para levar à única pessoa capaz de provocar aquela tormenta.

Havia retornado de missão há poucos dias após três meses investidos em coletar informações sobre um certo alguém. Tinha viajado muitas partes do mundo, derramado sangue de várias nações e marcado o fim em locais que ele jamais havia visto antes. Escutou pessoas o chamando de shinigami antes de encerrar suas vidas. Assim como notou a desistência de muitos ao vê-lo. O mundo estava mesmo mudando – e ele fazia parte daquilo.

Caminhando pelo extenso corredor até o salão principal do esconderijo, Terukami ouviu vozes misturadas em ritmo de conversa. Levantou a guarda varrendo o ambiente com suas habilidades sensoriais. Tinham vários chakras diferentes, mas nenhum deles parecia amistoso. Estavam em harmonia apesar das vozes altas. O líder não estava presente no seu campo de alcance, mas não era novidade. Ele nunca estava. Era um fantasma naquele mundo, não conhecia ninguém capaz de localizá-lo apenas pelo chakra.

Aquilo era a prova definitiva de sua divindade.

Terukami paralisou a alguns passos do salão. Todos seus músculos estremeceram, os batimentos aceleraram. Uma sensação de morte atravessou os sentidos do ninja, causando nele a percepção de estar prestes a encarar seu próprio fim. Engoliu em seco, nunca havia sentido nada parecido antes. Fechou os olhos e os abriu com um lampejo vermelho que durou apenas um instante, o suficiente para aliviar a tensão no corpo e colocar uma perna após a outra com os ombros firmes debaixo daquele manto.

Acessou o salão encontrando pessoas com longos mantos pretos, cabelos de várias cores e formatos e aparências simples, mas com chakras marcantes. Ele não estava entrando numa reunião qualquer. Mesmo sendo tão forte, eles não se dignaram a desviar a atenção de quem falava para vê-lo. Porque seu chakra era tão menor do que a maioria daquelas figuras que não valia a pena; ele sabia que não era assim tão forte quanto a presença daqueles seres. Os escolhidos pela divindade mascarada eram mais que mensageiros como ele – eram os executores das mudanças divinas.

— Você finalmente voltou, meu mensageiro — a voz áspera atrás da máscara interrompeu a fala de um dos outros membros da reunião ao sentir o chakra de Terukami. — Quais são as novidades?

Terukami caiu sobre um dos joelhos, a cabeça baixa fez os cabelos pretos esconderem o rosto. Os chakras ao redor dele flutuaram amistosos, impacientes, provavelmente incomodados com um ser como ele ser capaz de chamar a atenção da divindade

— Infelizmente, não encontrei o paradeiro de Kagushiki, porém, descobri uma estranha ligação dele com a Igreja.

Os ânimos de todos mudaram. Terukami ergueu o rosto, a divindade fez um gesto com os dedos para ele se colocar em pé. Assim ele o fez, encarando a todos com firmeza ao ajustar os óculos no rosto. A pressão sentida instantes antes havia desaparecido.

— Ele e o sumo sacerdote tem raízes muito mais antigas que muitos aqui presentes. Talvez ele tenha participado da fundação dessa religião, ou tivesse outra função.
— Um líder político envolvido com religião? — uma mulher de cabelos rosados debochou. — Que novidade, hein?
— Ele mesmo se fez uma lenda, mas estar ligado diretamente a esta religião é intrigante — comentou um homem alto de cabelos afro.
— Um velho envolvido com outro velho, nada de novo — resmungou um jovem de cabelos escuros.

O líder mascarado suspirou fazendo todos se calarem. Terukami engoliu em seco. Pensou na possibilidade de ter falhado em sua missão. Se assim fosse, ele não teria serventia alguma ao deus mascarado. Ajoelhou-se novamente, esperando ouvir a sentença.

— Muito bem, meu mensageiro.

Seus olhos ficaram arregalados encarando o chão, os óculos sustentados na ponta do nariz. O coração errou uma batida e voltou ao ritmo acelerado. Quis sorrir. Tinha realizado uma coisa boa. Estava mesmo ajudando a mudar as coisas, a impor a vontade da Verdade.

— Graças a todos vocês estamos chegando ao momento de expurgar as sombras que pairam sobre este mundo. Todas as últimas peças estão sendo alinhadas, até mesmo aquelas que não se dobraram perante nosso poder, como o caso da Nuvem, fará parte desse momento através de outros métodos. — O mascarado abriu os braços emitindo uma enorme intenção assassina e onda de chakra que fez todos na sala suarem frio. — Está chegando o momento do Fim ser anunciado e cumprido em todo o mundo! Para isso, preciso de todos vocês uma vez mais para uma coleta especial.

Embora assustados, todos os presentes caíram sobre um dos joelhos e, de cabeças baixas, assentiram a ordem ainda não dada pelo mascarado. Terukami sentiu o alívio caindo sobre seus ombros e teve certeza – a divindade estava lhe dando forças para continuar até o fim.

— Eu sou o escolhido dos céus para derrubar este mal! — uma pessoa disse distante daquela reunião com outra máscara. Abaixo dele, doze pessoas se ajoelhavam com mantos brancos marcados pelos símbolos da igreja. — Vocês sacerdotes dessa vontade são de extrema importância para que o mundo alcance a iluminação.

Esticou o braço direito para o lado, a capa branca colada ao antebraço deslizou criando um enorme véu. Apertou os dedos como se esmagasse um inseto, balançou o braço e abriu a mão para o alto.

— A guerra santa está se aproximando, sangue será derramado, mas teremos de aceitar as dores deste mundo se quisermos iluminá-lo! Por isso, contem ao mundo onde estamos. Deixe que saibam tudo que esteve acontecendo e quem carregou isto por aí, deixe que vejam a magnitude de tudo isso!

Abaixou a mão aberta tocando na superfície da máscara. Todos os sacerdotes levantaram os rostos ansiosos. Ele sentiu a flutuação no chakra de cada um deles. Por detrás da peça de metal, sorriu. Pressionou os dedos nela e puxou lentamente do rosto, fazendo os cabelos caírem sobre a testa e bochechas, e atirou a máscara contra o chão abrindo os braços logo em seguida com um feixe de luz acertando-lhe a face.

— Este mundo será salvo!

E a voz de todos os sacerdotes foi ouvida incendiando o pequeno espaço no País das Fontes Termais.

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