O sol iluminava o campo de treinamento de Konoha, refletindo em duas figuras que se econtravam no local. A primeira era mais velha, ríspida, inflexível. Tratava-se do policial Kotokami, que estava responsável pelo treinamento da segunda figura no local. Essa era mais jovem, mais inexperiente, mas já havia sido pior antes. De algumas semanas para cá, o jovem havia treinado junto com Kotokami incansavelmente, de modo que sua evolução era visível aos olhos de seu professor, mesmo que ele não fosse admitir isso.

O ninja havia treinado diversas técnicas sob a tutela de seu mestre, e hoje era o dia de aprender uma de grande importância para seu desenvolvimento como shinobi: a técnica assinatura de seu clã.

Os Hozuki eram conhecidos por sua afinidade com o suiton, característica essa que já tinha sido abordada constantemente durante o treinamento ninja de Kaito. Mas além de sua afinidade com o Suiton, este clã reserva para si a habilidade de converter seu próprio corpo em água. Uma técnica como essa pode ter diversas aplicações, e era de grande interesse para a vila que o jovem a aprendesse o mais cedo possível.

– Escuta aqui detento. Hoje nós vamos estar treinando o seu Suika no Jutsu.

– Suika no jutsu? – Kaito perguntou.

– Se trata de uma técnica de seu clã. Naturalmente, eu não sou um Hozuki, então não vou poder mostrá-la para você, mas passei mais cedo no quartel general e solicitei o seu pergaminho.

Logo após a fala, Kotokami arremessou um pergaminho no ar para que Kaito pegasse, ao mesmo tempo que continuava.

– Te adianto que a maioria de suas dúvidas não vou poder responder, mas isso é bom. Não vai poder ficar na minha sombra pra sempre, aprenda a se desenvolver por si só.

Kaito não mostrou nenhuma reação ao carão que levou sem sequer ter dito nada, mas acenou para seu professor e se pôs a ler o pergaminho prontamente.

– Acho que eu entendi. Não parece ser tão difícil assim, pelo menos não mais difícil do que as técnicas que nós treinamos nos últimos tempos.

Kotokami nada disse.

– Pois bem, vamos lá. –

Kaito colocou seu pergaminho de lado e fechou os olhos, concentrando-se por alguns instantes antes que seu braço direito começasse a se mover de modo estranho como se estivesse perdendo seu formato. Quando o mesmo se desfez e foi substituído por um filamento de água, Kotokami quase soltou um "incrível...", impedido somente pela sua determinação em menosprezar o jovem ninja da folha. Kaito abriu os olhos e olhou mais uma vez para seu instrutor.

– Realmente não é tão difícil assim, só demandou um pouco de concentração no começo pra calibrar o nível certo de infusão de chakra. Mas sinceramente, já fizemos coisas mais dificeis. –
Seu braço voltava a se materializar enquanto os dois conversavam.

– Consegue usar isso naturalmente? Em uma situação real você não vai ter toda essa calma para fazer isso. – Kotokami questionou.

– Imagino que sim, realmente não parece muito diferente do qu-... – Sua fala foi interrompida pelo chamado de um oficial da vila que se aproximava com visível preocupação.

Ambos se viraram surpresos em direção ao homem e escutaram atentamente ao que ele tinha a dizer. Assim que terminou, o olhar de Kaito se voltou mais uma vez para Kotokami, esperando que ele lhe dissesse o que fazer.

– E então? O que acha? –

Sem demonstrar um pingo de preocupação, o homem alcançou o bolso de sua calça e tirou um maço de cigarros juntamente a um isqueiro. Calmamente, levou o cigarro a boca, o acendeu, deu uma longa tragada, e expulsou a fumaça de seus pulmões, observando a mesma se fundir ao ar do acampamento.

– Você tem muita sorte detento. Se um pedido como esses tivesse vindo algumas semanas atrás você decepcionaria os superiores da vila por rejeitar a missão, ou iria lá e morreria antes que pudesse fazer alguma coisa. Mas graças ao treinamento intenso que passamos nesses últimos tempos, acredito que talvez, só talvez, você esteja à altura de encarar isso. –

Kaito deu um sorriso, o que era incomum de se ver em uma interação entre aqueles dois.

– Está dizendo que estou pronto para encarar missões de combate? –

– Estou dizendo que você está pronto para ser testado. Não se engane, estarei te vigiando de longe e fazendo anotações. –

– Heh, vamo lá, eu te encaro todo dia. – Kaito dizia se levantando. – Não tem a mínima chance desses caras serem um desafio maior do que isso.

Kotokami também se levantava.

– Você fala como se já tivesse conseguido encostar em mim. A regra número um é nunca subestimar seu inimigo, esqueceu? –

O sorriso de Kaito se desfez.
– Tem razão, desculpa. – Virou-se para o oficial e agora dizia para os dois shinobis simultaneamente. – Vou acertá-los de um jeito que não consigam reagir, não se preocupem, eu cuido disso. –

E então partiu em direção ao local da missão, determinado a mostrar sua ascensão a si mesmo e ao seu sensei.

Já como era de se esperar de um ambiente como a vila da folha, os arredores do hospital eram adornados por árvores verdes e saudáveis. Ansioso para chegar até a frente do estabelecimento e procurar alguma forma de se infiltrar até o lado de dentro, onde Kaito imaginava estar o ladrão, o garoto surpreendeu-se com o surgimento de uma forma elétrica, vinda de trás do tronco de uma das árvores.

— Merda! — Exclamou ao ver que a forma se moldava como um cachorro, disparando em sua direção apenas rápido o suficiente para que o jovem rolasse seu corpo para o a esquerda, evitando o contato com a técnica.

Consciente de que o usuário da técnica provavelmente estaria no mesmo local de onde o cão elétrico surgira, realizou um único selo de mão assim que seu corpo se estabilizou.

As suspeitas do jovem se confirmaram logo em seguida, quando o homem revelou sua localização atrás da árvore, esbravejando que não aceitaria ser pego, pois aquela era sua única forma de não passar fome. Em situações diferentes, Kaito se identificaria e talvez solidariezasse com o homem, procurando uma alternativa a violência. Contudo, o treino de Kotokami aos poucos começava a mostrar sua influência sobre o julgamento do garoto, que instintivamente descartou a hipótese de uma conversa antes de neutralizar a situação de perigo.

Era como seu guardião havia falado antes de se despedirem: Nunca subestime seu inimigo. Kaito não daria abertura para que o bandido arrastasse a luta por muito tempo, e assim, levou uma das mãos que realizava o selo até sua boca, proferindo:

— Suiton: Hatō... —

Logo em seguida, uma forte e massiva corrente de água preenchia o espaço entre os dois, avançando em direção ao criminoso.

A intenção era atordoar o inimigo de uma vez e garantir que perdesse as esperanças de que poderia vencer o combate desde cedo , tornando o resultado inevitável desde o princípio.

Era esperado que a kunai arremessada pelo inimigo, acoplada a uma kibaku fuuda, tivesse suas propriedades explosivas anuladas devido o contato com a torrente de água. Se esse não fosse o caso, ao menos seria empirrada para longe, de volta na direção de que viera.

Caso o homem ainda estivesse consciente, Kaito finalizaria alertando-o:

– Antes de mais nada vou precisar que você se acalme. Coloque as mãos pra cima sem gracinhas, por favor. – disse, surpreendendo-se com como pareceu Kotokami falando.

Kaito soube soube no momento que o homem caíra no chão que algo não havia ido como ele tinha planejado. Pensou que o treinamento com Kotokami havia começado a blindar sua mente contra fraquezas, e talvez até tivesse, de fato, mas aquilo era demais. Sua falta de controle havia machucado alguém, e não só isso, mas alguém que só queria ter algo com o que se alimentar.

A passos lentos e medrosos, como se tivesse medo de descobrir o destino do homem que atacara, tentou se aproximar, parando logo que o mesmo soltou suas últimas palavras: “Eu sinto muito. Só queria me alimentar.”.

O jovem permaneceu fixado onde estava, sem se atrever a desviar o olhar por um segundo sequer. Mais uma vez, mais uma vez o seu descontrole tirara a vida de alguém. Depois de sair da cadeia havia se perguntado se merecia aquela liberdade depois do que fizera. Sinceramente, após encontrar seu propósito, não seria difícil imaginar que o garoto sentisse que sim, mas aqui estava, novamente encarando uma alma levada pela sua fraqueza.

Quando uma figura feminina surgiu, soltando expressões de desprezo ao homem recém falecido e comemorando a recuperação do lucro naquele dia, Kaito sentiu como se tivesse traído todas as suas origens, como se tivesse sido manipulado até virar um fantoche sem rosto e sem voz. Como se tivesse sido doutrinado a se tornar a máquina de matar que tanto desprezava.

Ele sentia muita raiva, tanta raiva que suas mãos tremiam. E quando a mulher se aproximou para compartilhar sua fatia do dinheiro recuperado, Kaito lhe revelou a maior expressão de ódio imaginável. Dentes cerrados e lágrimas rolando por sua bochecha.

A missão havia sido cumprida.