Isolado no campo de treinamento na parte externa da grande casa de sua sensei, Shüra praticava alguns golpes com sua espada de madeira. O plenilúnio era dominante no céu negro estrelado sem nenhuma presença de nuvens, a lua amarela parecia até mesmo estar mais próxima do que o comum do deserto, sendo uma ótima companhia para os solitários de corações vazios.

Cortando as frias correntes de ar, um pequeno e jovem corvo vinha com destino fixo até a residência de Unohana, buscando o Shinigami Branco. Ele o avistou na parte externa e então se pôs a voar ao redor do garoto, este que logo estendeu seu braço para que a ave pudesse pousar, fazendo uma carícia suave no topo da cabeça antes de retirar o papel que estava enrolado em sua pequena pata.

Logo antes de revelar o conteúdo, o Tokujo estranhou o pergaminho não ter o selo oficial do gabinete da Kazekage, ficando claro que não era uma mensagem oficial. Ao desenrolar e ter acesso ao escopo do papiro, Shüra logo entendeu ser uma mensagem de Camila, a mulher a qual o jovem encontrou outrora, solicitando um encontro reservado entre eles, a moça alegava ter informações importantes que gostaria de repassar ao rapaz imediatamente. Shüra suspeitou um pouco, mas talvez ela realmente pudesse ter alguma informação relevante pro Shinigami, auxiliando assim durante sua trajetória até alcançar seus objetivos.

Sem muita pressa, o rapaz se despediu de sua sensei e novamente fora ignorado por Lenore, o deprimindo levemente por alguns instantes. Se pôs a caminhar até o local estipulado na carta.

O ponto de encontro era em uma taberna abandonada próxima às muralhas ao sul da vila, um local mais periférico e mais esquecido por parte do governo. Rodeado por beberrões e maltrapilhos, aquele definitivamente era um local perfeito para reuniões informais desse tipo.

Ao adentrar no estabelecimento, Shüra teve dificuldades de encontrar a pessoa que o havia convocado até ali, mas logo uma figura coberta por um capuz sinalizou nas mesas mais ao fundo. Sem hesitar, o Tokujo se aproximou e sentou-se de frente para a pessoa em questão. Boa noite, Carmila. Por baixo de toda a roupa o rapaz conseguiu vislumbrar um sorriso encantador de canto de boca, ela era uma mulher muito forte e atraente e isso desconcertava o rapaz de certa forma. Olá, Shüra.

O silêncio reinou entre eles por alguns minutos, até a mulher sentir-se confortável para revelar as informações que havia prometido pela carta. Escute, sei de seus interesses e por isso acho que fará algo produtivo com o que vou te falar. Hector é um chunin que aparentemente está agindo como espião, coletando e repassando informações para outras vilas ou organizações, eu o vi em contato com uma figura estranha nas redondezas das muralhas, ele o entregou um pergaminho lacrado, algo extremamente suspeito. Ache-o e então o elimine. Shüra cruzou os braços e se afundou um pouco na cadeira velha de madeira. Por que você está me passando essa missão e não alguém do gabinete ou do quartel-general? Carmila suspirou e levou uma de suas mãos no rosto demonstrando um certo grau de desapontamento. Eu levei a informação pro gabinete e não acreditaram, mas um dos conselheiros me procurou em particular e disse que se eu eliminasse o merdinha e trouxesse provas, ele aceitaria isso como uma missão cumprida. Então eu te escolhi pra isso, mais alguma pergunta idiota ou podemos começar? O rapaz consentiu calado, porém levemente irado com o tom de voz de Carmila. Tente me ferrar e eu irei te matar.

O rastreio do Shinobi suspeito estava sendo mais difícil do que o Shinigami acreditava, ele não havia deixado rastro algum por Suna, era como se ele não quisesse ser encontrado de maneira alguma, fortalecendo assim o ponto levantado por Carmila. No começo eu tinha minhas dúvidas, mas agora é fato que esse desgraçado está tramando algo.

A dificuldade na busca era evidente, Shüra tinha consciência que deveria adotar uma linha de raciocínio diferente da sua anterior, por tal decidiu invadir a casa de Hector.

A residência aparentava estar vazia, batidas na porta sem respostas foi a "permissão" que o Tokujo precisava para invadir a mesma. Com uma de suas kunais, o rapaz executou com perícia o arrombamento da fechadura sem deixar marcas significativas. O interior do local estava uma bagunça, folhas e pergaminhos empilhados por todos os cantos, além de restos de alimentos e o forte odor. Esse lugar é um lixo. Era evidente que Hector estava realmente envolvido com algo, bastava agora Shüra descobrir com o que exatamente, mas, ainda mais importante do que isso, o Shinigami deveria antes encontrar a localização atual do traidor e então eliminá-lo pelo bem de Sunagakure.

Após algumas dezenas de minutos em uma busca sem sucesso, Shüra encontrou uma espécie de planta de construção e - tomado pela curiosidade - decidiu averiguá-la. Após alguns momentos analisando, o rapaz deduziu que a mesma era extremamente semelhante com a estrutura geral de Suna, no entanto nenhum ponto local estava descrito ali, somente as limitações da vila e alguns pontos chaves escritos à mão. O que isso pode ser? O rapaz pegou a planta e a pôs embaixo do braço, saindo rapidamente do local em direção ao quartel-general.

Já no QG, Shüra solicitou uma planta oficial e atualizada da Areia, embora questionado e sob suspeitas, o mesmo conseguiu convencer o shinobi de plantão a lhe ceder o que desejava. O Shinigami correu para uma grande mesa vazia que se encontrava no local e estendeu ambas as plantas em paralelo, buscando analisá-las e encontrar alguma similaridade. Apesar de ambas serem parecidas, não havia nada que fizesse sentido e ligasse uma a outra dessa maneira, porém em um breve momento o rapaz notou que no local onde deveria ficar o gabinete da Kazekage na planta encontrada na casa de Hector, havia ali um grande círculo com uma descrição sobre uma saída diretamente dentro do prédio. Tomado por um insight, Shüra colocou as plantas sobrepostas e foi aí que as coisas ficaram claras, o papel encontrado na residência do traidor era um mapa do subterrâneo de Suna, demarcado em pontos estratégicos para sejá lá qual fosse o motivo. Desgraçado! O Shinigami então disparou, levando consigo ambas as plantas para se guiar, buscando adentrar o subsolo pelo túnel mais próximo. Dentro da academia ninja.

A noite avançava e com ela as ruas se esvaziavam cada vez mais, até estarem repletas de solidão. O silêncio era tanto que era possível ouvir o uivar dos cachorros selvagens nas montanhas há alguns quilômetros de distância. A única exceção de vida presentes nos becos e vielas era Shüra, que corria até a direção da academia. Sua recém descobertas sobre os túneis subterrâneos fora algo que o mesmo não esperava, apesar do seu medo prematuro sobre o que Hector poderia estar planejando lá embaixo, o rapaz sabia das diversas possibilidades a seu favor que esse subsolo poderia proporcionar a ele em tempos futuros.

Chegando no edifício - obviamente vazio devido ao horário - o Shinigami invadiu o local pelo terraço, onde uma escada de acesso ao telhado quase sempre se encontrava semi-aberta e, felizmente para o tokujo, ela se encontrava destrancada. Levando em consideração o possível cenário, Shüra não perdeu tempo nos níveis superiores do prédio, se direcionou a correr até o térreo e então buscar a possível entrada para o então misterioso túnel subterrâneo.

A construção era relativamente grande, sendo assim o belo e gracioso jovem sabia das dificuldades que enfrentaria para encontrar a passagem, afinal de contas o mapa não mostrava exatamente onde ela se encontrava e com toda certeza a mesma estaria escondida por algo, seja uma estátua, tapete ou afins. Shüra então decidiu separar o local em seções e vasculhar de maneira organizada, buscando quase sempre olhar por trás de móveis maiores e robustos e ignorando o que obviamente não seria suficiente para mascarar uma entrada.

Minutos foram se passando em uma velocidade assustadora, a busca do Shinigami estava complicada e suas tentativas se demonstravam praticamente inúteis, restando apenas uma última seção que logo revelou-se não ter absolutamente nada. Ele cedeu, decidiu não perder mais tempo ali naquele local e encontrar uma saída que pudesse ser mais fácil de se localizar, sendo assim o garoto saiu do prédio e então se escorou em uma rocha do lado externo da construção, mas ainda em seu terreno. Ele novamente puxou ambos os mapas e os colocou um em cima do outro, pesquisando as demais entradas e então tentando decidir para qual deveria seguir. Entretanto - seja por sorte ou destino - o garoto notou que o nível de areia acima do arenito onde estava era mais baixo do que a poucos centímetros ao seu lado e uma grande quantidade estava separada pouco a frente dali, como se o local exato tivesse sido escavado a alguns dias. Observando mais de perto, Shüra pôde notar que isso continuava até abaixo da rocha, foi quando esforçou-se para mover a mesma e assim revelou a entrada que tanto buscava. Bingo.

A entrada estava tomada pelo breu, e assim que Shüra aproximou a cabeça para tentar olhar melhor o interior se deparou com um morcego que saia voando às pressas de dentro do túnel. Apesar de escuro, a escada ainda era parcialmente visível, sendo assim o rapaz conseguiu descer e então ter acesso ao que buscava. Era possível ouvir o ecoar da queda de areias e pequenas pedras dentro do túnel, fazendo o ruído ressonar por metros além do ponto focal.

Caminhar ali era complicado, o rapaz se encontrava receoso com tudo, afinal de contas era um mundo completamente desconhecido e poderia muito bem estar preparado para receber invasores desavisados de maneira inóspita e agressiva. Cada passo era milimetricamente dado com cuidado, não queria pisar em algo que pudesse feri-lo ou até mesmo pior.

Estava mais do que óbvio que dessa maneira ele não chegaria a lugar algum e suas chances de se perder eram grandes. Foi quando sua ficha caiu e então se lembrou de seu vício em cigarros e que por consequência sempre trazia consigo um isqueiro que havia roubado de seu pai em tempos já muito antigos. Ele então tateou seu bolso até encontrar seu maço de cigarro, sacando e levando a seus lábios um deles e logo em seguida o acendendo. Com o isqueiro aceso em mãos, ele conseguiu facilitar a visualização do que estava a sua frente, podendo assim iluminar seu caminho mesmo que de maneira parcial.

Apesar de aliviado com a situação, o rapaz logo viu seu corpo congelar e se paralisar ao sentir uma respiração pesada e irregular atrás de seu pescoço. Assustado, ele se virou aos poucos e iluminou o que estava anteriormente em sua retaguarda com sua fonte de chama, revelando assim uma figura a poucos centímetros de si o encarando por baixo de uma máscara velha e estranha. Além do objeto sinistro que cobria seu rosto, o mesmo utilizava-se de vestimentas igualmente assustadoras e também um capuz surrado. Em uma das mãos, ele segurava firmemente uma kunai velha e balançava o braço que aparentemente estava ensanguentado. Em um desses balançar, ele quase levou a kunai a realizar um corte horizontal na altura do pescoço de Shüra, fazendo o mesmo sacar sua espada e então se afastar poucos metros. Você é o Hector? Não recebeu respostas. Carmila me disse que está tramando algo, eu exijo que me revele com quem está negociando informações sobre Suna. Novamente sua indagação não obteve uma resposta, o único som que a figura emitia eram gemidos estranhos que mais pareciam ocasionados por dor.

Perto de perder a paciência, o Shinigami novamente indagou sobre a identidade daquela pessoa ou ser, exigindo que ele se identificasse e também revelasse o que estava fazendo ali, além de, claro, quais eram os objetivos desses túneis misteriosos. O desconhecido grunhiu, muito mais alto do que anteriormente e então, enfurecido, balançou seu braço com a kunai em diversas direções enquanto andava até Shüra. O tokujo viu o quão inútil seria tentar tirar alguma informação daquela pessoa, por consequência disso ele então utilizou de sua técnica denominada Hien e separou o tronco do mesmo em duas partes após realizar um corte na horizontal na altura do final de suas costelas. Já morto e caído no chão enquanto quantidades exorbitantes de sangue escorriam de si, o falecido não largava sua kunai de maneira alguma. Foi quando Shüra observou mais de perto e então notou que a mesma estava colada de alguma forma a sua mão, impossibilitando o mesmo de abrí-la. O jovem então retirou a máscara que cobria o rosto e então sua identidade fora revelada. Era Hector, no entanto seus olhos haviam sido arrancados, sua boca costurada e seus ouvidos estourados. Mas que merda é essa? Era uma visão completamente assustadora, obviamente ele havia sido pego por alguém e largado ali, seja lá qual fosse o motivo.

A mente de Shüra trabalhava a milhão neste momento, ele buscava entender o que poderia ter acontecido ali, mas nada estava claro o suficiente para ter uma explicação lógica. Seria isso uma punição dada por alguém pela traição de Hector? Mas não faria sentido ser isso, afinal era simplesmente matá-lo ou entregá-lo… Há alguém por trás disso e preciso descobrir quem é, afinal de contas essa pessoa também tem conhecimento sobre esses túneis, não posso deixar essa informação ser vazada. O Shinigami pegou a parte superior do corpo de Hector que havia cortado e subiu juntamente com o mesmo de volta à superfície, ele tinha que falar com Carmila sobre a situação da missão e também sobre suas suspeitas.

Buscar por aquela mulher linda, elegante e misteriosa seria complicado, afinal de contas a única coisa que o jovem sabia sobre ela era seu nome e também que é uma ex-integrante da Gotei 13, por tanto nem mesmo tinha conhecimento sobre a localização de sua casa ou onde passava a maior parte de seu tempo. Obviamente também não estaria na taberna que se encontraram, afinal já havia se passado algumas horas desde então.

Caminhando no caminho que levaria até sua residência, Shüra notou alguém encostado em um um dos muros na esquina da quadra onde morava. Era Carmila, esperava o retorno do Shinigami e também respostas. Achei que tivesse morrido. E esse deve ser o Hector. Shüra sorriu para ela e então de pôs a contar todos os fatos. Entendo, realmente é preocupante… irei levar as informações para os conselheiros e então tornar essa uma missão oficial. Descanse, logo será convocado novamente. Ela se aproximou do rapaz e o beijou em seus lábios. Você é um bom homem, Shüra Hohenheim.