Missão:

Eu não sabia exatamente o que achar daquela missão. Digo, uma missão de nível Chuunin logo após me formar na Academia? Por algum motivo, aquilo parecia obra do Mabui-sensei. Ele sempre disse que eu tinha um potencial avassalador em mãos, mas que ainda tinha medo da grandeza e isso me limitava. Ao me indicar para uma tarefa como aquela, ele me colocava em uma posição de pressão em que ou eu dava o meu melhor ou desistia. E... bem, é óbvio que não vou simplesmente largar minha primeira grande missão da carreira.

Com o pergaminho de instruções em mãos, eu cheguei minha mochila pela última vez antes de passar pelos portões da vila. O fato daquela ser uma missão fora da vila me deixava ainda mais ansiosa porque... digamos que eu não sou exatamente a melhor guia turística que alguém desejaria ter. Sendo capaz de errar até a rua da minha própria casa, a necessidade de viajar horas sozinha era o suficiente para fazer minhas mãos ficarem suadas e eu sentir uma certa relutância em dar passos em frente.

— Vamos, X, não seja medrosa. Você consegue, é só olhar o mapa, não tem segredo. — falei comigo mesmo. De olhos fechados, tentei me concentrar na minha própria voz e usar aquilo de incentivo para dar início à missão por definitivo. Com o mapa preso entre os dedos, eu o apertei como se minha sobrevivência dependesse daquilo; e talvez dependesse mesmo. Receosa, mas me recusando a desistir antes mesmo de tentar, dei então o primeiro passo para além dos portões. A partir daquele ponto, me restava torcer para que nada de ruim me acontecesse.

Missão:

— Droga, X, era só seguir o mapa, literalmente seguir o mapa. Qual a dificuldade nisso? Literalmente marcaram em vermelho a rota que você precisava seguir. Droga. Que... droga.

Bem, não precisa de muita imaginação para entender o que aconteceu. Eu não precisei de mais do que alguns minutos andando sozinha para confundir um vá para a direita com um vire para a esquerda e a partir disso perder todo o controle da situação. Sentada no chão de terra, eu abri o mapa à minha frente e me inclinei para a frente. Minhas mãos seguravam ao lado do meu rosto, ora escorregando pelo suor de nervosismo que escorria da minha testa até o queixo. De olhos vidrados no papel com desenhos diante de mim, quanto mais eu o encarava mais parecia que aquilo era algum tipo de mensagem criptografada.

Aliás, por mais engraçado que isso possa soar, a minha maior preocupação em estar perdida não era nem meus pais ficarem preocupados, a vila me dar como perdida ou os comerciantes viajarem sozinhos, mas que escurecesse e eu me visse obrigada a ter que caçar para não ficar com fome. Eu sei que esse tipo de coisa faz parte daquela tal de sobrevivência que um ninja deve dominar, mas eu não tenho vergonha de admitir (em meus próprios pensamentos) que tenho um certo medo desse tipo de coisa.

Demorei um bom tempo até conseguir me acalmar e voltar a ter o mínimo de coesão em meus pensamentos. Apesar de saber que nervosa eu não conseguiria resolver aquilo, falar é mais fácil do que fazer, então precisei ser paciente naquele momento. Ainda observando o mapa, tentei ser minimamente lógica na intenção de escapar daquilo. Até onde consigo lembrar, sempre tive problemas pra me localizar mesmo em ambientes rotineiros. No começo era só uma ligeira falta de noção de espaço, uma perna roxa porque bati no canto da mesa ou algo assim. Mamãe disse que foi porque andei rápido demais e é engatinhando que se aprende essas coisas. Sempre ri daquilo como se fosse uma piada, mas no fundo levava como verdade. Até hoje não sei se isso faz mesmo algum sentido. O ponto é que isso logo evoluiu para um suposto problema de memória que logo descobriram ser na verdade algum tipo de desvio de atenção.

Mabui-sensei sempre me falou que eu poderia superar minha suposta limitação pessoal com trabalho duro. Eu melhorei bastante depois dele começar a me dar aulas particulares, mas as coisas sempre ficam fora de controle quando estou nervosa, então acho que esse foi o agravante que me fez chegar naquele ponto em que eu estava. De olhos fechados e respirando fundo para focar minha atenção, tentei lembrar das instruções que Mabui me deu de forma repetitiva e quase incansável para fixar na minha mente. Eu tinha aquilo gravado, sim, só estava difícil de espairecer. Com um passar de dedo na testa para limpar o suor, me inclinei em direção ao mapa e tratei de tentar novamente.

Agora com um mínimo de noção em mente, eu tentei pensar de forma lógica. Primeiro, olhei nos arredores tentando comparar algum ponto de referência que pudesse comparar com o mapa. Ao não conseguir isso, lembrei da estratégia mais básica de perseguição: pegadas. Olhando para trás, as marcas dos meus pés ainda estavam visíveis no chão de terra, então eu decidi fazer o caminho inverso. Dessa forma, se eu não conseguisse ir até o vilarejo dos herbalistas, ao menos eu tinha mais chances de voltar em segurança para a Nuvem.

Andando alguns minutos, encontrei uma cachoeira que era facilmente notada no mapa. Eu tinha dificuldade em saber em que parte daquele papel eu estava, então o truque foi utilizar um segundo ponto de referência: uma parte mais aberta da floresta. Me colocando entre aqueles dois pontos, eu consegui finalmente entender exatamente onde eu estava e com isso em mente ficou simplesmente óbvio para que lado eu deveria seguir. Eu repeti esse processo durante todo o trajeto, o que por minhas dificuldades acabou levando um bom tempo. O importante é que depois de muito tentar, eu finalmente pude avistar a entrada do vilarejo no horizonte. Com o coração calmo, eu deixei a sensação de conquista tomar de conta. Me senti realmente vitoriosa.

Missão:

Eu não sou de mentir. Na verdade, eu consigo contar nos dedos as vezes que usei desse artifício na minha vida e não me orgulho de metade deles. No entanto, daquela vez, eu fiz aquilo sem nem sentir as mãos tremerem. Quando me aproximei do grupo de mercadores todos prontos apenas me aguardando, eu não disse que me atrasei porque me perdi e fiquei tempo demais choramingando até me colocar de volta no caminho. Ao invés disso, inventei sobre uma luta com um javali selvagem furioso que me estava perseguindo viajantes na estrada. Eu não cheguei a pensar nesse detalhe, mas um dos mercadores mencionou que devia ter sido difícil já que eu estava toda suja. Foi só porque eu fiquei sentada no chão, mas me permiti apenas dar um sorrisinho ao ouvir aquilo. Pois é, eu não neguei.

Pelo horário que saí da vila, eu teria um tempo para descansar antes de colocar o pé na estrada novamente, mas dada a situação em que me meti não me sobrou muito tempo para isso. Foi assim que só consegui beber um cantil de água antes de me colocar à frente do grupo de vendedores. Recém chegada, o caminho ainda estava muito fresco na minha mente. Ainda assim, eu só consegui me sentir (minimamente) segura depois de olhar no mapa novamente e confirmar o trajeto, bem como registrar os pontos de referência.

— Bom, a trilha está segura agora que já lidei com o javali, então deve ser uma viagem bem tranquila. Vou seguir na frente, mas qualquer problema podem me chamar.

Acostumados a fazer aquele trajeto, todos apenas concordaram e se ajeitaram prontos para partir. Guiando-os na frente, eu estava me sentindo até que bem calma. Consegui fazer aquilo uma vez, só precisava fazer de novo. O que poderia dar errado?

Missão:

A viagem foi realmente tranquila durante boa parte... exceto por um trecho específico em que a vida parecia querer me dar uma lição sobre mentiras. Sim, eu inventei toda aquela história sobre o encontro com o javali, eu só não esperei ter que realmente lidar com um durante o caminho de volta. Já tinha anoitecido e fora eu somente os guias das carroças estavam acordados. Apreensiva, fiquei o tempo todo atenta acreditando que aquele era o melhor momento para bandidos atacarem e tentar um roubo. Eu estava tão paranóica disso de aparecerem ladrões que quase não percebi quando um javali passou correndo cortando a trilha que seguíamos.

Os cavalos se assustaram de imediato, o que serviu para me tirar daquele transe de antes. Não tinha muita iluminação fora a própria lua, além de eu não me sentir pronta para lutar com um bicho daqueles. Felizmente, a criatura se assustou tanto quanto nós, e após bufar enquanto parecia considerar se nos atacaria ou não ele simplesmente virou-se e seguiu floresta a dentro. Eu me certifiquei de estávamos sozinhos e de que o bicho já tinha se afastado antes de indicar que poderíamos seguir em frente e assim aconteceu.

Chegamos na Vila da Nuvem ainda de madrugada. Como meu trabalho era apenas levá-los em segurança até lá, eu fui dispensada assim que fizeram o "check-in". Naquela noite, eu tive um sonho super estranho em que um garoto com uma máscara de javali me perseguia pela floresta. É, foi bem estranho se quer saber.

Missão:

Ao abrir os olhos naquele dia, eu pensei que meu trabalho com o grupo de mercadores já tinha acabado. Para minha surpresa, uma nova mensagem foi deixada à minha porta e fui novamente requisitada no gabinete administrativo. Ainda um tanto sonolenta, foi a minha próxima missão que me fez abrir os olhos em surpresa. Ao que parece, um roubo tinha acontecido na mercadoria de remédios que eu tinha escoltado até a vila. De início eu pensei que iria levar uma bronca; já que eu era a responsável pela segurança de tudo, talvez jogassem a culpa pro meu lado. De certo modo, eu concordava com tal "sentença", muito embora não tenha acontecido nenhuma movimentação estranha durante toda a viagem e eu sequer poderia tentar adivinhar quando o tal roubo aconteceu.

Suspirei em alívio quando fui informada que o roubo aconteceu em algum momento entre a chegada da vila e o encontro com os responsáveis por receber o carregamento, então de fato não tinha como a culpa ser jogada pra cima de mim. Ainda assim, por já conhecer os comerciantes, eles consideraram que eu seria a melhor indicada para realizar uma investigação e descobrir o que tinha acontecido.

Me dirigi até a pequena casa que foi cedida pela vila aos mercadores. A ideia era que voltassem para seu vilarejo depois da entrega, mas como aconteceu esse imprevisto e a vila queria investigar decidiram então ceder uma moradia momentânea. Não sabiam quando o culpado seria encontrado, então foi a decisão mais sensata que puderam fazer no momento. Com três batidas à porta, eu esperei ser atendida para enfim começar a fazer a minha parte. Quando mais rápido eu começasse, mais rápido o culpado seria levado à justiça.

Missão:

Eu deslizei minha mão sobre a mesa da sala deixando um objeto descansando no alcance da visão de todos. A família de mercadores se entreolhou compreendendo um ao outro sem precisar mesmo falar. Alguns ficaram surpresos, outros pareciam já esperar, mas o ponto é que tínhamos uma pista sobre o suspeito e essa pista era que ele...

— ... faz parte da família de vocês. Digo, é o seu brasão, certo? — apontando para o broche, evidenciei o desenho em alto relevo que ali estava. Encontrado por entre os caixotes em que foram roubadas coisas, aquilo poderia não significar nada no sentido de que todos os envolvidos com os remédios usavam aquele mesmo broche. Se um deles falasse que simplesmente perdeu o seu, dificilmente suspeitariam. O ponto é que quem quer que fosse tentou não se incriminar, no que todos da família mencionaram ainda ter seus broches consigo.

O primeiro passo foi pedir para que mostrassem seus símbolos. Todos, sem exceção, colocaram seus broches sobre a mesa, o que foi uma surpresa pra mim. Se é que alguém tinha mesmo perdido o seu acessório, ele não deveria conseguir colocá-lo ali à vista de todos. Questionando se cada um tinha mais de uma daquelas coisas, me foi dito que sim, no que em um suspiro eu entendi que o meu plano não funcionaria. Perguntei se desconfiavam de alguém, mas todos relutaram em acusar alguém. Na verdade, percebi que ficaram desconfortáveis só com a ideia de ter que de alguma forma apontar um dos seus como o responsável. Naquele momento eu comecei a me perguntar se eles não estavam se acobertando. Não partiu deles a ideia de achar o culpado, foi uma iniciativa da vila, então talvez estivessem protegendo os seus.

Com esse pensamento em mente, decidi que continuaria a investigação por conta própria. Se continuasse esperando que eles me contassem algo útil, provavelmente seria manipulada em algum momento e isso me desviaria do meu objetivo.

Missão:

Passei as próximas horas do dia metida entre uma carroça e outra tentando encontrar qualquer nova pista que me ajudasse em alguma coisa. Eu não queria demorar muito naquela atividade porque quanto mais tempo levasse, mais chances o culpado teria de escapar e camuflar sua passagem. Os mercadores pareciam desconfiados e de certa forma dificultando a minha transição entre as carroças, o que só serviu para alimentar a minha ideia de que eles estavam acobertando o delinquente. Àquela altura a pergunta que pairava na minha cabeça era "por quê?".

Não fazia sentido pra mim aquele roubo ser um plano de toda a família. Eles sabiam que a carga passaria por uma vistoria assim que chegasse na vila e quaisquer diferenças de material seria rapidamente percebida. Não tinham nada a ganhar fazendo aquilo a não ser manchar o seu próprio nome. É, aquilo realmente não fazia sentido. Pela lógica, eles também foram pegos de surpresa com a situação, mas se recusavam a voltar pra casa com um dos seus preso na vila. Se fosse esse o caso, eu conseguia entender o sentimento porque me colocando no lugar deles eu não faria diferente. De coração gentil, minha intenção era partir para conversa e deixar mesmo aquilo passar em branco. Infelizmente, seria a minha reputação a ser manchada no lugar da reputação dos mercadores, e apesar de bondosa eu não sou idiota a esse ponto.

O sol já estava começando a se pôr quando encontrei algo interessante: um dos vidros do remédio caído no chão da última carroça. Quebrado, seu líquido parecia ter respingado na madeira. Eu me agachei para ver mais de perto e foi quando encontrei um pedaço de tecido preso a um prego. Ainda insuficiente para incriminar alguém de verdade, decidi investigar a fundo. Sem avisar os comerciantes dos motivos por trás, comecei a chamá-los um por um para mais uma "entrevista". Relutantes e ligeiramente agressivos, eles responderam minhas perguntas de qualquer jeito. O questionário não importava, porque minha intenção com aquilo tudo era analisar com bastante folga a roupa de cada um deles procurando por rasgos que encaixassem o pedaço encontrado. É, não estava sendo uma tarefa fácil.

Missão:

A comparação de roupas não deu muito certo e a noite já tinha caído quando eu percebi que não conseguiria encontrar mais nada naquele dia. Depois de me despedir dos comerciantes e avisar que voltaria no dia seguinte, eu decidi por dar a volta e me deitar no telhado olhando as estrelas. Apesar de ansiosa, ver o céu estrelado a Nuvem servia para me fazer esquecer o dia cheio de problemas. Sendo uma vila no topo da montanha, era mais fácil conseguir apreciar o céu noturno e eu amava isso. Eu estava distraída quando comecei a escutar uma conversa vindo da casa dos herbalistas. Começaram falando alto, mas então alguém pediu para falar baixo e o tom foi diminuindo gradativamente. Admito que eu não estava me concentrando nisso, mas eles por coincidência foram justamente para dentro do cômodo em que eu estava deitada em cima. Eu ensaiei que iria me levantar para dar-lhes privacidade, mas então percebi que eles falavam do roubo e isso me paralisou por alguns segundos.

Não dava pra ouvir muito bem, mas uma voz feminina mencionou que eles estavam ferrados e tudo por culpa de alguém com nome que não consegui entender. Uma voz masculina se levantou dizendo que ele esperava mais apoio ao seu plano, no que foi interrompido por uma voz também masculina e mais grave chamando-o de inconsequente. Uma segunda voz feminina mandou os dois parar, no que a voz grave de antes se desculpou e eu pude perceber um suspiro. Com medo de ser percebida, eu voltei para casa agora com uma grande pista do que tinha acontecido. Ao me deitar, praticamente não dormi; temia que ao fechar os olhos eu esquecesse as vozes que ouvi e não conseguisse identificá-las.

Ao amanhecer, eu cheguei na casa emprestada aos mercadores rapidamente. Mencionei que a investigação não tinha dado muitos frutos, então logo eles seriam liberados. Fingindo formalidade, levantei para apertar a mão e cumprimentar cada um dos membros daquela família. Um por um eu puxei mesmo assuntos de uma frase apenas para ouvir suas vozes. Nisso, descobri que a primeira voz era da filha mais velha do casal dono da loja de ervas. A segunda voz masculina era do pai e a segunda voz feminina era a mãe. Passei reto por outros três irmãos até chegar no filho mais novo e... bem, não tinha como errar. Em um estalar de dedos, acionei o sinal que tinha combinado com os guardas que me acompanharam secretamente naquela manhã. Todos se assustaram com a invasão daqueles caras portando a bandana da Nuvem, mas eu estava certa do que estava fazendo.

— É este, guardas, podem prender Senhores, preciso que me levem até os pertences do seu filho.

Em gritos tentando impedir a prisão, eles tentaram fingir que não tinham ouvido minhas instruções. Na frente dos meus veteranos, eu precisei ser forte e aumentar o tom de voz. Não me senti confortável fazendo aquilo, mas serviu para que eu fosse atendida. Revirando sua bolsa, encontrei uma calça rasgada que encaixava perfeitamente com o tecido que encontrei na carroça no dia anterior. Não apenas isso, mas encontrei um tipo de fundo falso na mochila onde um pequeno baú de madeira foi escondido. Ao abri-lo, lá estavam: os remédios que faltavam no carregamento. Com as provas em mãos, eu vi a família continuar tentando me impedir de seguir com aquilo. Por um momento, pensei em recuar. No entanto, ser bondosa significava não ser conivente com aqueles atos ilícitos. A família não tinha feito nada além de acobertar o delinquente, o que por si só seria motivo para prendê-los também, mas eu fingi não saber disso para evitar mais sofrimento.

Naquela noite, também quase não consegui dormir. Os pedidos desesperados dos pais pedindo para que não levássemos o seu filho me deixaram inquieta. Pensar que uma prisão sequer se compara ao dever principal de um ninja (matar, no caso) não serviu para me acalmar. Quando enfim fechei os olhos em pura exaustão, o sol já estava surgindo na janela. Aquilo com certeza ficaria um bom tempo em minha mente.