I




— Nenhum adversário irá esperar até que reúna energia natural suficiente, rapaz.

　　Ele ouvia a voz do rei estourar em sua direção enquanto bloqueava os assaltos de Hannya com o fio de sua espada. O demônio parecia flutuar diante de seus olhos tamanha era sua velocidade, mas não era difícil acompanhar. Seus pés firmaram no chão ajeitando a postura de combate e seu corpo cintilou na direção do oponente como um vendaval. O tilintar do sino anunciou a presença da Sombra às costas do mascarado, ele segurava a katana pelo cabo apenas com a mão direita, deixando a ponta do aço encostar sutilmente na nuca de sua presa.

　　Não é sobre ganhar ou perder, no entanto, sua respiração já pesava um pouco depois de horas praticando sob a tutela dos reis. Cada palavra dita por eles ao longo daquele dia que parecia interminável ecoava em sua mente ainda que fossem poucas as vezes em que lhes dessem qualquer orientação. Baixou sua arma e esperou até que o outro girasse sobre os calcanhares e estivessem frente a frente outra vez.

　　— Sua velocidade é realmente impressionante, Warui-san. — pontou o maior antes de se armar para mais uma rodada.

　　A Tempestade respondeu com o silêncio, mantendo o olhar afiado como sempre o fazia em uma peleja. “Está pensando demais”, se recordava da voz da rainha dizendo horas mais cedo logo que havia sacado sua espada para o primeiro embate. “É como respirar: você não precisa se concentrar para isso, você simplesmente faz, é instintivo”, os beijos de aço seguiam ecoando no Reino Sombrio e ele ainda buscava assimilar as poucas instruções de seus mestres.

　　A teoria é bastante simples, seu companheiro de treino caia incansável sobre si, seus golpes não eram pesados, mas eram velozes e parecia disposto a lhe tirar até mesmo o tempo para refletir. No momento em que esta percepção o atingiu, Warui começou a entender tudo ainda que de forma tardia. Ele não quer que eu pense, balançou a espada para se chocar com as grandes garras do mascarado, fitando serenamente. É como o kenjutsu, em que a espada passa a ser parte de mim e não simplesmente uma arma as faíscas dançavam junto ao deus e ao demônio, em um ritmo quase combinado.

　　Um passo atrás o deu um segundo para ajeitar sua guarda e respirar fundo, um ato instintivo. Lançou o corpo para a esquerda antes de seus pés se moverem fazendo-o desaparecer diante dos olhos de Hannya. Em todo o curso até o momento em que caiu sobre o outro buscando um assalto no ombro esquerdo, pode sentir o caos do Jigoku o abraçar, envolvendo cada centímetro do seu corpo enquanto se deslocava.

　　Hannya aparou a espada e emendou com um contragolpe mirando seu pescoço, e um singelo movimento para o lado salvou sua vida. Buscou estocar o abdômen do demônio com a ponta de sua arma e viu único passo para trás frustrar sua tentativa, mas seus instintos rugiram quando sentiu a energia sombria dentro de si.

　　A Tempestade avançou outra vez, riscando propositalmente o fio sob os pés do mascarado. Um salto do outro para recuar fora acompanhado pelo avanço do Sexto com o ombro direito o empurrando na altura do peitoral e lhe tirando o equilíbrio ainda no ar. Warui ergueu a mão que empunhava a espada rapidamente, parando a lâmina ao lado direito do pescoço de seu alvo antes que lhe tocasse e arrancasse um filete de sangue. Viu a criatura recolher as garras e fez o mesmo ao guardar a arma dentro da bainha.

　　— Formidável, senhor.

　　— Viu? É mais simples do que parecia, não acha? — a voz de Shirayuki estava mais próxima, mas ele já havia sentido a aproximação da rainha com os olhos da mente.

　　— Se fosse simples, qualquer um seria capaz de fazer. — retrucou, sentindo as gotas de suor escorrerem pelo corpo e empaparem sua roupa. — O conceito de fato não é complicado; a aplicação, por outro lado...

　　— Seu treinamento está terminado, garoto. — Dokuro chamou sua atenção com seu costumeiro tom grave e ríspido. — Volte para seu reino, já temos nossos senhores aqui.

　　— Eu não pretendia me alongar, Dokuro. — o tratamento seguia sem mesuras, mas agora ele já se colocava em igualdade com o rei e a rainha. — Meu reino precisa de um deus, afinal.