Alguma coisa soava ligeiramente errada naquele dia. Até então apenas uma chuva insistente que mais parecia infindável é que assolava a aldeia verdejante do país do fogo. O caso é que ninguém esperaria pela convocação que se deu ao fim da tarde, quando os raios solares já haviam se extinguido, ao que o gigante foi subjugado pelas tantas montanhas ao redor da vila. Ainda assim, a luz que antecedia a escuridão plena da noite nublada se esticava por mais uma boa parcela de minutos quando adentrou em desespero pela porta do quartel general uma das assistentes da sombra do fogo.

— Eu preciso encontrar com o chefe de policia agora! — De seus olhos escorriam lágrimas que evidenciavam a necessidade e urgência daquela requisição.

— Me acompanhe — Saito estava em uma de suas idas ao banheiro comunitário do lugar, visto que o de sua sala não estava funcionando corretamente.

Os passos do comandante eram lentos enquanto que aguardava inquieta em sua retaguarda a jovem garota, não muito mais nova que o Uchiha. Ainda assim, a menina não o apressou nem por um instante e pelo estado em que se encontrava, era de fato aquilo que o rapaz esperava. O corredor para Saito sempre foi do mesmo tamanho, mas para aquela assistente nunca foi tão longo. No mais tardar, chegaram de fronte para a sala de Guts.

O soar de três batidas suaves ecoou pelo cômodo silencioso onde se encontrava o atual chefe de policia da folha. O lugar não era o que pode-se chamar de espaçoso, mas tinha um toque caseiro um tanto quanto sofisticado e único. Sobre a mesa duas ou três pilhas de papéis bem organizados uns sobre os outros. Nas costas do que se assentava disposto a atender e resolver casos se localizava um armário baixo com um conteúdo de conhecimento único e inteiramente de seu dono. Sobre o móvel era possível ainda identificar dois bonsais adornando um retrato de Guts e sua falecida esposa.

— Entre — Disse de sua cadeira.

— Com sua licença, senhor — Saito moveu a maçaneta calmamente e deixou que a jovem assistente entrasse primeiro, não que já não estivesse absurdamente ansiosa para fazê-lo.

A sala foi tomada rapidamente por falas quase que inextinguíveis por parte da menina, que seguia desesperada em busca de ajuda. Todavia, com todo aquele alvoroço nem um dos dois oficiais ali presente conseguiam interpretar suas palavras. Saito e Guts eram muito parecidos no quesito calmaria e ambos se encararam enquanto o Uchiha fechava a porta e se posicionava diante da mesma. O chefe de policia por sua vez, se levantou e caminhou até um balcão abaixo do grande autorretrato que produziu. Retirou da superfície um bule com chá e após despeja-lo em uma xicara, ofereceu a jovem assistente a fim de acalma-la.

A assistente tentou se conter ao máximo, mas falhou. Aos prantos e tremendo como se fosse uma vara verde sem forças para sustentar seu próprio peso, recolheu o recipiente das mãos de Guts. Inconscientemente e com o controle de seus movimentos ligeiramente comprometidos pela ansiedade que se acometia, a moça eventualmente deixou transbordar com tantos movimentos espasmáticos uma boa parcela do líquido contido na dita xicara, envergonhando-se e pedindo desculpa entre os soluços e lágrimas. O chefe de policia era bom em lidar com pessoas e para o cargo não era mais do que o esperado, apenas sorriu e assentiu com a cabeça.

— Minha querida, sente-se aqui por um momento e tente se acalmar — O sujeito era um brutamontes repleto de cicatrizes e com a falta de um dos braços. Sua espada gigantesca estava escorada nos fundos do cômodo, mas chamava atenção como se estivesse pendurada em seu pescoço.

— Me perdoe, senhor, mas eu estou aflita com a situação atual — Disse a jovem enquanto se sentava na cadeira disposta por Guts. O sujeito por sua vez escorou-se a mesa, virado para a menina que chorava e tentava explicar o que acontecera — Me chamo Sakura e vim aqui solicitar o resgate da assistente conhecida como Setsuno.

Por um instante tanto Saito quanto Guts congelaram. Setsuno era uma figura importante na aldeia, sendo uma das cotadas para se tornar uma anciã de oficio e não apenas uma assistente. Os olhares que trocaram evidenciava a qualquer um alheio a situação de que de fato estavam muito mais atentos àquela situação. Todavia, ainda se podia ouvir pela sala apenas o choro e o tinir da xicara se chocando com o pires mediante a tremedeira da mais nova. Saito encarou o chefe de policia com um olhar mais especifico, como se questionasse algo. Guts apenas acenou com a cabeça em afirmação.

— Sakura — Disse o Uchiha enquanto tocava no ombro da moça sentada afim de chamar sua atenção. Seus olhos antes cor de ônix tornaram-se outra vez avermelhados mediante o uso do sharingan.

Naquela singela troca de olhares Saito lançou sobre a menina uma técnica de controle mental que a induziu a um estado de dormência. Para preservar a integridade e saúde da mesma, evitando que ruísse contra o solo desequilibrada, Guts a sustentou e recostou-a no encosto do assento, de modo que agora dormia tranquilamente na cadeira. O pires com a xicara por sorte não partiram-se ao cair no chão. Saito os recolheu e colocou sobre a bancada enquanto o chefe de policia levava o indicador da destra aos lábios, ponderando muito seriamente acerca do que faria.

Saito manteve-se de costas para o chefe que se colocou a pensar, fazendo exatamente o mesmo. Seus olhos se mantinham avermelhados sob o uso da técnica hereditária que utilizara para colocar sobre efeito de sono aquela que a poucos momentos atrás lhes alertou acerca do sequestro ocorrido. Grande parte do contingente militar da aldeia estava fora em busca de informações acerca do despencar do grande satélite e por isso a linha de defesa principal era nada menos que a força policial. O fardo não vinha acompanhado de qualquer glória, ainda assim, era necessário fazê-lo.

— Quem poderia ter capturado Setsuno? — Indagou o Uchiha enquanto virava-se para Guts, escorando-se no balcão.

— Existem algumas opções, umas tão obvias que precisamos descartar — Retrucou o grande colosso abastado de músculos que liderava a policia.

— Certo, então nada de outros aspirantes a ancião? — Ponderou Saito, tendo como confirmação um aceno positivo com a cabeça.

— Temos conhecimento de alguma rixa familiar ou disputa? — Questionou Guts enquanto encarava o Uchiha.

— Pensando em Gilga? — Respondeu prontamente ao lembra-se do filho invejoso que já havia se metido em problemas outrora por conta do ódio que sentia por sua mãe, culpando-a desde muito novo pela morte de seu pai.

— Não há como negar que a suspeita mesmo sendo óbvia não pode ser descartada — Disse o sujeito se dirigindo lentamente até sua cadeira onde sentou-se.

— Vou ficar adiante neste caso. Assim que possível informo do andamento — Saito anunciou e logo dirigiu-se para fora dali.

O primeiro passo, na mente do Uchiha, era reunir o seu esquadrão e sem perder um minuto sequer, dar inicio a tarefa de localizar e neutralizar a fim de investigar e arrancar respostas do filho de Setsuno, Gilga. Do lado exterior no que concernia a sala de Guts, Saito permitiu que seus olhos rolassem pelo corredor e já num primeiro momento encontrou o chunin conhecido como Mello. Dificilmente poderia ser visto a sorrir ou mesmo tinha talento para se comunicar em grupo, todavia possuía um senso de rastreamento agressivo que era do interesse do Uchiha abusar e aprimorar com o devido uso de gatilhos e situações.

— Está ocupado? — Disse Saito sem ao menos cumprimentar o sujeito que possuía aproximadamente a mesma idade.

— Não, senhor comandante. Precisa de algo? — Indagou enquanto se aproximava com as mãos para dentro dos bolsos da jaqueta de couro marrom que utilizava. Seus passos eram lentos e indicavam uma calmaria semelhante a do Uchiha.

— Temos que encontrar uma pessoa, mas antes preciso terminar de convocar o esquadrão — Retrucou, caminhando agora ao lado de Mello na direção do saguão do quartel.

— Precisa de sugestão ou já tem todos os membros em mente? — Questionou o garoto de cabelos loiros.

— Sei exatamente quem irei chamar — Finalizou Saito.

Diante do saguão, Saito parou seu caminhar e olhou para Feitan, sentado relaxadamente em uma poltrona polindo até mesmo o próprio aço de sua espada. Seus olhos avermelhados então se dirigiram para Mello com que enviando uma mensagem. O sujeito de cabelos loiros entendeu perfeitamente, eram ambos providos de alta capacidade intelectual. Enquanto o Uchiha voltou-se para a entrada de sua sala e dirigiu-se até a mesma para encontrar a última integrante daquele esquadrão, Mello se aproximou de Feitan a fim de coloca-lo a par da tarefa que realizariam, mesmo que soubesse dela apenas o superficial.

— Feitan, como vai? — Disse o sujeito com uma marca no lado esquerdo do rosto assim que viu-se diante do companheiro.

— Hum? — Arqueou a sobrancelha para encarar o de cabelos loiros. Feitan era o mais baixo ali, mas de longe o mais proficiente no uso de lâminas. Tal qual Mello era um chunin aspirante da policia.

— O comandante Saito está montando um esquadrão para uma missão de busca. Me mandou até aqui para avisa-lo e pedir que se prepare, sairemos em breve — Explicou o rapaz.

— E você tem ideia do que nós vamos buscar, Mello? — Questionou Feitan.

— A julgar pelo humor do comandante, alguém importante — Retrucou, sentando-se ao lado do companheiro para aguardar a saída.

Em paralelo ao dialogo do lado externo da sala, Saito encontrou a moça de cabelos loiros de costas. Parecia estar embaralhando um punhado de papéis sobre a mesa do Uchiha e nem ao menos deu-se conta da presença do mesmo. O rapaz encostou-se de braços cruzados na porta, relaxando sua postura por alguns instantes enquanto admirava a bela formação daquele corpo esbelto e tão jovial que era o de Robin. Talvez não tivesse percebido em meio a tantas preocupações pairando sobre sua mente tão avançada e nos últimos dias atarefada, mas o fato é que estava apaixonado.

— Humpf — Soou com certo desprezo ao anunciar sua presença. surpreendendo sua companheira que quase deixou que voassem os papéis que organizava.

— Comandante — Disse ao virar-se para o rapaz — Não tinha percebido que havia chegado.

— Na verdade faz pouco tempo, eu estava te procurando e quando vi que estava ocupada, resolvi deixar que terminasse — Disse Saito, caminhando vagarosamente até sua mesa onde ajudou Robin a finalizar sua tarefa.

— Qual a razão para me procurar? — Questionou com uma voz doce e gentil, mesmo que rígida e séria.

— Temos um trabalho importante. Vamos juntos, eu e você, formar um esquadrão de quatro pessoas que vou chamar de Shōmetsu. A assistente desapareceu e precisamos encontra-la. A suspeita é que ela tenho sido sequestrada pelo próprio filho Gilga. Nos encontramos lá fora com o restante do grupo em cinco minutos — Ao fim da fala, Saito retirou uma mecha de cabelo da frente dos olhos de Robin e realocou-a atrás de sua orelha antes de sair.

O lado de fora do quartel general estava relativamente escuro. A rua onde se localizava a sede da corporação não era o que pode-se chamar de bem iluminada, mas isso tinha seu propósito. Apesar de todos terem o conhecimento acerca da existência da incansável força policial, muitos acabavam se esquecendo. Esses que se esqueciam quase sempre dedicavam-se a criminalidade. Mas ao contrário do que estes indivíduos imaginariam, eles estavam sendo constantemente observados pelas sombras ocultas da folha. Não apenas o caçadores da ANBU serviam como protetores obscuros, mas também a corporação na qual Saito vinha se adequando.

— Certo, estão todos aqui — Disse o Uchiha assim que se encontrou com o restante dos membros de seu esquadrão.

— Então, comandante, qual nosso alvo? — Indagou Feitan.

— Bom, em resumo Gilga — Retrucou levianamente.

— O filho problemático da assistente Setsuno? — Questionou, desta vez Mello.

— Exato. Há pouco tempo foi dada como desparecida aquela que vem sendo cotada para ingressar no grupo de anciões conselheiros do vilarejo. Por conta desta ascensão e dos problemas que sempre teve com seu filho ressentido, assumimos eu e Guts que trata-se de um sequestro. Precisamos encontrar Gilga e interroga-lo para descobrir o que aconteceu e qual o estado da vitima.

Saito precisava traçar um plano de ação e a julgar pelo tempo que demorou para reunir todos os membros do grupo, tinha muito pouco tempo para isso. Fazer uso de seu avantajado intelecto quase sempre sugava uma boa parcela de sua energia, tendo em mente que o esforço psicológico não deixava em nenhuma instancia de ser um esforço e como qualquer ação, demandava intensidade e compromisso. O fato é que tinha uma vantagem sobre Gilga que se tivesse de fato feito o que suspeitavam, teria deixado pistas demais pelo caminho. A menos que seu objetivo fosse ser encontrado facilmente, estava fracassando.

— Certo. Vocês se conhecem e sabem as capacidades de cada um, mas para que fique claro: Mello será o responsável por rastrear nosso alvo. Robin será nosso suporte e em caso de confronto direto, Feitan abrirá caminho. Todos de acordo? — Ambos se reunião em um circulo do topo de um edifício não tão distante da residência de Gilga, onde iniciariam a busca sobre direção de Mello, o ninja sensor.

— Sim, comandante — A resposta veio em coro por parte de todos ali presentes sem se abster nenhum.

Feitan tateou sua espada tão característica com punho lembrando o cabo de um guarda-chuva. Mello por sua vez agachou-se e tocou com dois dedos - indicador e do meio - no solo, em busca da assinatura de chakra do alvo. Saito rolava seus olhos avermelhados por todos os lados a fim de não ficar alheio a nada. Robin se posicionava entre os três, preparando-se para prestar suporte quando necessário.

As construções que se erguiam com direção ao firmamento eram repletas de referências as arquiteturas antiquadas de tempos oriundos aquele. Entretanto, ainda assim era possível identificar certo toque de modernismo e de odor contemporâneo no que compunha aquela orquestra magistral. O fato é que em todos os sentidos as residências daquele complexo onde a família de Setsuno vivia desde muitas eras atrás conseguia tocar em todos os sentidos aqueles que se propunham a contemplar sua beleza. Para o mal ou para o bem, a equipe destacada para realizar aquela busca sem dúvidas não tinha a opção de se recusar ao vislumbre momentâneo daquela paisagem.

— Senhor, existem duas assinaturas de chakra no interior da casa mais afastada do complexo que me chamaram atenção. Uma claramente está mais fraca que a outra, como se estivesse rendida. Pela descrição de nossa missão eu acredito que possa se tratar de nosso alvo e sua vitima — Relatou Mello.

Saito levou a destra até o queijo e o sustentou ponderando por milésimos de segundo em como agiria.

— Vocês três, preparem-se. Mello, qualquer mudança de cenário nos avise. Robin, identifique possíveis armadilhas e Feitan, sua prioridade é finalizar o alvo. Qualquer um naquele cômodo que não seja a senhora Setsuno ou nossa equipe, deve morrer. Pronto? — No instante em que recebeu a confirmação, tanto Saito quanto o restante do esquadrão avançou na direção da residência apontada por Mello.

Os quatro estavam alocados em pontos estratégicos ao redor da casa. Saito mantinha a destra erguida em paralelo ao seu corpo, como sinal para que aguardassem. Seus olhos avermelhados conseguiam ver através das frestas nas tabuas envelhecidas do velho casebre. No chão ajoelhada e amarrada a vitima Setsuno era mantida. De pés, esbravejando palavras que o Uchiha não conseguia ouvir e em meio a prantos Gilga, como suspeitaram. O garoto não tardou em dar o sinal. Assim que teve sua mão abaixada todos entraram. Robin avançou na direção da aspirante a anciã para recolhe-la, Gilga com a sua espada em mãos preparou-se para golpear a garota.

Antes que pudesse desferir o movimento Feitan surgiu cruzando lâminas com o sujeito, de maneira que a menina de cabelos loiros pode evadir dali com a senhora. Mello utilizou uma técnica para paralisar o alvo e Saito se aproximou caminhando lentamente. Seus olhos vidrados nos de Gilga que balbuciava falas de ódio em meio a muitas pragas que o Uchiha deu de ombros.

— Sabe como eu gostaria de ter minha mãe por perto? — Saito trocou olhares rapidamente e acometeu sobre o mesmo um sono profundo. Feitan colocou o sujeito sobre seus ombros e caminhou para fora dali junto com o resto do esquadrão. Tomaram como rumo o quartel general onde entregaram a vitima em plena saúde e o alvo para que fosse preso. Haviam terminado o primeiro trabalho juntos.