Após algum tempo ali as coisas pareciam minimamente ajeitadas, digo, menos as piscinas que provavelmente eu precisaria contratar alguma ajuda quando sobrasse algum tempo ou desenvolvesse coragem. Mas, o mais importante, a forja da casa, já estava consideravelmente limpa e alguns livros de sua antiga dona recuperados... Dentro do possível. Já havia algum tempo eu vinha basicamente trabalhando com isso para evitar que a minha herança não retrocedesse em demasia, e, era bom ver que ali a menos tinha algumas anotações daquela que pra começo de conversa me ensinou tudo que eu sabia à respeito.

Eu já tinha o que era necessário para ser considerada uma ferreira experiente? Bem, isto era algo que aquela experimentação poderia dizer. Com setas velhas e uma katana enferrujada faria algo que ainda não tinha tentado e que segundo as escritas era ainda mais difícil que criar algo - consertar algo. Ligo a forja que já não via calor faz algum tempo, vejo as reações das paredes da fornalha e cuido se precisasse de alguma manutenção imediata, mas, parecia ter sobrevivido bem ao tempo sem uso por sua estrutura bem sólida. Era, no fim, tudo ali muito bem feito e cara o suficiente para ser confiável.

Começo a preparar os equipamentos ao meu redor, pinças metálicas, o martelo agora lixado pra tirar suas ranhuras de desgaste. Mergulho a arma em um ácido utilizado neste tipo de procedimento, um ácido fraco qualquer e começo a lixar para tirar o excesso logo antes de aquecê-la. Sopro a sua superfície para tirar um pouco da fuligem e continuo o processo. Limpo a arma quando termino e a forja já está bem aquecida para que eu possa introduzi-la ali afim de colocá-la quase sobre ponto de fusão.

Quando removo com auxílio da garra uma lâmina rubra começa a ser o alvo de firmes marteladas que aos poucos vão desempenando o equipamento. Meus olhos passeiam vez ou outra sobre os textos nos cadernos que Chi deixou para trás, buscando uma aprovação de uma pessoa ausente ali. O gume, agora um refeito era novamente polido e tomava forma sobre novas dobras. O fio era refeito depois, em um afiar cuidadoso e quase natural, criado pelo tempo que ia me fazendo mais experiente e por uma mentalidade que apesar de frágil por minhas fraquezas, ainda era afiada em seus raciocínios. Será que ela me aprovaria se me visse?

O pensamento angustiante logo é deixado de lado para cuidar da forma. Recorte cuidadosos com uma talha faziam o que era uma assinatura no armamento que agora tinha um dedinho meu, mais como um adorno para dar algum charme em algo que eu mexi. Como ela não era nada tão especial como a tesoura que estava jogada ao canto, não ia muito além destes primeiros cuidados. Era mais uma confecção precisa que uma confecção bela, e, neste ponto eu conseguia satisfazer à mim mesma, pelo menos.

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E então, havia aquela última provação, o alçar do ultimo de uma mestra em forja e quiçá com um pouco de engenharia envolvida? Bem, eu precisava disso para me manter sendo uma peça chamativa para o estado da água e a vila da névoa. Enquanto nukenin, alguns dos meus serviços oferecidos particularmente através da conexão com Haru e o auxílio com as missões de busca para suas ervas de fato era algo vinculado que nutria um pouco desta aliança provisória. O trabalho ali na floricultura talvez tivesse o seu lugar, sendo eu até paga por ele de todo modo apesar de ser um pouco mais subjetivo mediante o restante dos ganhos.

Eu não havia me esquecido porém que parte do meu retorno prometido ali era como uma ferreira hábil que pudesse suprir suas necessidades com a confecção de armamentos sólidos de qualidade suficiente para que ninguém pudesse equiparar-se. Enquanto minha mãe tinha sua especialidade voltada às vestimentas e por consequência na habilidade de proteger, eu era bem mais vinculada ao aço e a capacidade de fazer armas, onde talvez sentia que pudesse ir um pouco além e me destacar, talvez sendo chamada pelo nome de mestra artesã local.

Não precisar buscar todo meu equipamento também seria bom para falar a verdade, passando isso em forma de pedido de missões vez ou outra. Bem, era hora de parar de me distrair. Em frente ao espelho com uma haste de metal componho de forma quase ritualística algumas pinturas em um tom alvo sobre a pele, prendendo meu cabelo rigor ao longo de tranças para trás para que não atrapalhassem ou acumulassem fuligem. Em minha mão pego uma pequena estrutura de eixo com que venho trabalhando pelos últimos tempos. Uma pequena roda com triângulos e molas em seu interior que funcionava de forma a girar e travar uma intersecção em algum equipamento de forma rápida.

Me ater ao polimento mais preciso que alguém poderia oferecer talvez me levasse até o topo como desejava, mas, mais do que uma precisão cirúrgica consigo me lembrar cada vez que Chi exaltava a criatividade. No fim, como estar no topo significa ter poucos em quem espelhar-se para abastecer com ideias as suas próximas invenções, ser criativa era uma parte essencial de tudo aquilo, segundo ela. Estendo uma folha começando o processo de criação pela parte mais limpa, os esboços do projeto. A mão desliza o lápis e o grafite deixado vai formando aos poucos a silhueta de uma longa lança com uma lâmina em uma de suas pontas. O tracejado alongado tem silhuetas mais esguias de um lado e ranhuras simétricas à estas em ao longo de sua outra metade.

Aos poucos, outros diagramas realizados de outras perspectivas visuais vão sendo compostos para ter uma visão periférica mais ampla do que é até certo ponto um outro rito de passagem, mas, também um equipamento em potencial de um possível cliente exigente.

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Com o projeto detalhadamente confeccionado e uma sala devidamente organizada posiciono os rascunhos sobre um grande quadro verde com alguns giz pequenos embaixo de si. Prego com pequenos alfinetes nas bordas de madeira e começo a pegar alguns materiais. Como ainda é tudo um tanto experimental utilizado aço, preservando assim materiais mais expansivos que são mais difíceis de obter, e, com algum esforço vou juntando tudo ali sobre uma longa bancada. Ainda utilizo o martelo de forja feito por Chi como meu instrumento, mas, me pergunto se em algum momento seria proveitoso que em vez disso eu passe a utilizar algo que eu mesma venha à confeccionar...

Bem, não sei, depende muito aí se o martelo em si teria alguma propriedade, mas, não vem ao caso. Naquele momento meu foco é construir uma arma ao redor daquela pequena engrenagem de semi giro limitado. Começo moldando uma longa barra de aço que se parece muito com um cabo qualquer inicialmente de algum utensílio domiciliar. O martelo tilinta sobre o aço enrubescido pelo calor da fornalha enquanto uma garra de sargento firma sua ponta e uma pinça de forja o faz mais próxima na parte em que vou alvejando. O calor escaldante dali de dentro até faz alguém facilmente esquecer que a vila da névoa se trata de uma vila mais fria se não pelos aquecimentos mais presentes e necessários nos itens após eles resfriarem o suficiente para dificultar que o trabalho prossiga.

A luva de malha em minhas mãos só não fere minhas mãos estalo após estalo por esta já ser tão calejada que isto é irrelevante. A empunhadura, do arco ou da espada, das armas ninjas ou de um martelo me fizeram mais dura ao longo de uma vida breve repleta de desventuras que à fazem parecer mais longa do que as viradas das luas sugerem. O eco do martelo que me faz pensar sobre pequenos detalhes triviais também é o que sob mãos treinadas vai achatando a arma conforme o esboço anterior, deixando-a mais larga e fina, mais segmentada. Um pique de tala e a peça se separa em duas. A lima começa seu trabalho forçando entre as bordas criando os detalhes mais rústicos. A boquilha por onde a outra ponta mais esguia encaixar-se-ia e a própria dorsal da lâmina.

A lixa então é utilizada para os polimentos mais precisos do que era um bastão e lança simultaneamente, já que a lança poderia ser escondida ao girá-la. Um contorno esférico ia sendo aperfeiçoado até as peças pudessem encaixar-se entre si. Pequenos fragmentos iam sendo colocados, um grosso semi círculo ia sendo composto como fixador e eixo de rolagem enquanto a pequena engrenagem que o fazia funcionar ao ser acionada também era encaixada. Os preparativos eram feitos para a penúltima parte que era afiar o fio da arma. Ela precisava ser igualmente letal como seria funcional, ambos os aspectos devidamente trabalhados para alcançar o máximo de eficiência. Mais um trabalho de polimento era feito ao redor para que ela fosse perfeitamente isa.

Então, com isto feito, alguns trabalhos de adorno iam sendo realizados para dar graça à arma que refletisse o mérito de sua criação. Uma arma que fosse mais ostensiva precisava parecer como tal para que fosse atrativa para aqueles que podem empunhá-la dentre as demais. O mecanismo é posto em prática e o tilintar metálico ecoa pelo ambiente enquanto a lâmina se faz sem nenhum atraso, sem nenhuma interferência que pudesse atrapalhar ou atrasar o seu usuário. E, é claro, aquilo seria entregue justamente para um usuário de tal em um dojo de um conhecido do meu falecido pai.

A feição não era bonita ao me ver, considerando todos os fatores, mas, como um mestre do bojutsu ele pega a arma pronto para experimentá-la. Ele a brande e por um instante sinto um sorriso pairando em sua face. Lhe entrego como um presente antes de minha partida, e, por trás de um semblante duro de um velho percebo que ele está satisfeito. Ainda havia muito o que aprender, mas, certamente também já havia avançado por uma longa parte da jornada.

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