O alvoroço no portão da aldeia não era em nada alheio ao mais novo chefe de policia da aldeia da folha. Saito já aguardava há algumas semanas a chegada de Tsuki Amano, a moça que assumiria o posto de líder do país do rio. O motivo pelo qual era aguardada, entretanto, não era tão atraente quanto. Existiam seguidores do antigo senhor feudal, que queriam estabilizar um novo líder vindo do grupo deles, mesmo que os anciões já tivessem definido que Tsuki assumiria. Saito não foi pessoalmente receber a jovem, na verdade estava em sua nova sala degustando com o antigo chefe de policia e agora seu conselheiro, Guts, um chá que o mesmo o havia indicado.

— Sabe, apesar de eu ter certo apreço por esse sabor agridoce, não acho que agrade a todos — Indagou o montante de músculos em voz serena que entrava em contraste rapidamente com seu porte físico — Não se preocupe com isso. Eu particularmente gosto da sensação que me causa beber chá e de estar na sua companhia sem tanto alarde com relação a missões, mas não deve se esquecer que eu não sinto gosto de absolutamente nada — Retrucou o Uchiha, tendo como tréplica apenas uma gargalhada por parte do amigo — Falando nisso, e quanto a situação da nova senhora feudal? — Questionou Guts, arrancando um suspiro do jovem chefe que cerrou os olhos avermelhados enquanto ponderava particularmente aflito.

Seu pensamento se via envolvido na lembrança do momento em que foi notificado de toda aquela situação. Como um filme passando em sua mente em meio a um punhado de flashs, deparou-se com a imagem de um dos anciões colocando-o a par de tudo acerca de Amano e sua respectiva ascensão ao trono máximo do país do rio. Seus olhos se abriram e viu-se diante do seu presente momento, olhando para Guts com seus olhos avermelhados, assistindo a figura do sujeito deliciar-se com o chá predisposto em sua xicara.

—  Na verdade eu destaquei o comandante Sengoku acompanhado de um esquadrão de outros quatro aspirantes e sargentos para escoltar a nossa convidada até o gabinete da sombra do fogo, onde ela vai se reunir com os anciões da aldeia e discutir acerca da estadia dela, que na verdade já está muito bem definida — Saito recolheu de sobre a mesa uma fotografia da jovem. Era realmente bonita e não aparentava mais de vinte e cinco anos — Eu acho que estamos voltando aos tempos de guerra, Guts. Cada vez mais pessoas jovens demais estão assumindo responsabilidades de alto risco. Eu me encaixo na descrição inclusive — Completou o Uchiha — Isso porquê estão cada vez mais capacitados os jovens. Isso não é motivo para se orgulhar? — Retrucou Guts — Eu sinceramente não sei responder. É estranho eu me sentir confortável com as responsabilidades que são atribuídas a mim e nervoso pelas que são atribuídas a outras pessoas.

Ambos os dois se mantiveram em silêncio por alguns instantes, claramente debruçando-se sobe os pensamentos expressados ali. A xicara semitransparente de Saito estava quase vazia. Levou aos lábios uma vez mais após dois sopros leves no que concernia ao objetivo de abaixar um pouco mais a temperatura do dito chá — Mas me diga, onde vão alocar a garota? — A dúvida de Guts cortou o silêncio e arrancou um pigarreio que acabou por engasgar o Uchiha com o chá que estava prestes a engolir. Após a tosse que antecedeu o momento em que recobrou sua postura, Saito encarou o sujeito com um olhar tímido e desajustado.

— Na verdade, acho que o senhor feudal do país do fogo tem um interesse direto no país do rio e na sua mais nova líder. Exigiu que os anciões designassem os melhores métodos para garantir a segurança de Amano — Sem que concluísse, deleitou sobre seus lábios a xicara uma outra vez, saboreou o gole que deu no chá e observou que Guts se mantinha ansioso para o complemento que viria, quase esboçando um riso bobo — O que está esperando? Me diga onde ela vai ficar! — Apressou o ex-líder, mudando a expressão de Saito para o desconforto. O Uchiha fechou os olhos e cerrou o cenho com a porcelana tocando seus lábios — Você já deve saber. Ela vai ficar na minha casa.

Guts ergueu o único braço que tinha junto do cotoco deixado do outro lado aos céus enquanto deixou que saísse de seus lábios uma gargalhada genuína — Eu retiro o que eu disse! Você com certeza ta com problemas — Saito afanou de olhos fechados. Se tivesse orelhas enormes como as de um cão, certamente estariam abaixadas em um claro sinal de tristeza quase que profunda — Pare de fazer alardes, ela pode chegar a qualquer momento — Retrucou enquanto abria a gaveta à esquerda e resguardava a fotografia da jovem Amano em seu interior. Estava prestes a esticar sua destra em busca da alça da xicara para enche-la novamente com o chá quando ressoaram pelo cômodo três batidas efetuadas contra a porta.

— Entre — Enquanto falou, levou o indicador aos lábios e lançou contra Guts um olhar deveras odioso, como se o alerta-se em suplica para não falar demais. Pela porta atravessaram Sengoku, Amano e um assistente mal encarado — Comandante Sengoku se apresentando. Vim finalizar a escolta da senhorita Tsuki Amano — Saito levantou-se, tal como Guts — Obrigado, comandante. Tsuki-sama é um prazer finalmente conhecê-la — A cortesia tinha como resposta um cumprimento saudoso com o flexionar dos joelhos e o inclinar do tronco por parte da futura líder — Bom, agora tenho que me despedir. Nos vemos em breve. Me acompanha até a saída, Sengoku? — Indagou ao despedir-se o antigo chefe de policia. Saito apenas assentiu com a cabeça — Queira sentar-se, por favor.

Não se faria necessário um sharingan para identificar a inquietação por parte do assistente. O sujeito era esguio e possuía um cavanhaque longo e fino que se estendia até seu peito. Seus cabelos não eram totalmente brancos, mas mostravam ser detentor de ao menos cinco décadas de vida. Tal ansiedade não seria um problema em dias normais, mas naquele em especial, os nervos de Saito resistiam ao chá que deveria acalma-lo. Não era todo dia que devia prestar seus serviços a uma causa tão banal quanto considerava ser a de vigiar uma moça da hierarquia nobre.

— Obrigada — Indagou a jovem Amano enquanto sentou-se a cadeira à frente do Uchiha. Em seu interior já ansiava pelo momento em que poderia se ver livre do sujeito mal encarado que parecia estar analisando cada milímetro de Saito, mas resistiu. Resistiu. Resistiu — Achei que iriamos vir até aqui falar diretamente com o chefe de policia — Não havia como ignorar aquela ofensiva. As palavras saíram dos lábios do magricela como se ele fosse o detentor da verdade absoluta e atravessaram a sala até o espirito de Saito como se fossem facas afiadas. O Uchiha em um instante estava de cenho franzido e prestes a se levantar para esbravejar contra o dito assistente quando teve a surpresa de a própria Amano levantar-se em fúria — Não lhe dei permissão para falar na presença do chefe da policia! Retire-se da minha frente agora mesmo! — Sua voz era doce, mas naquele momento carregava uma raiva e desaprovação que deixaram os cabelos de Saito em pé.

O sujeito não relutou, na verdade estampou em sua face a expressão de mais puro arrependimento e pavor. Abaixou a cabeça em respeito a sua madona e saiu pela mesma porta que outrora havia entrado — Peço desculpas pela falta de educação do meu conselheiro. Ele é um homem bom e só deve estar preocupado demais. Acredito que saiba que adquirindo inimigos demais nas últimas semanas pelo simples fato de decidirem que eu devia assumir o posto de líder do país dos rios — Enquanto expressava seus pensamentos, Amano sentou-se outra vez na cadeira de frente para Saito.

— Eu entendo bem como é ser acometido com tanta responsabilidade tão cedo. Como seu conselheiro deixou explicito, sou muito jovem para o cargo que ocupo, ao menos aos olhos da grande maioria. Mas gosto de pensar que sou capacitado para tal e que foi devido a isso que me indicaram ao posto. Sei que você não tem muitas opções que não confiar em mim, mas se puder tranquiliza-la, ainda não falhei em minhas funções desde minha entrada para a força policial — Saito desvirava uma xicara de sobre um pires e entregava a moça, despejando no recipiente o mesmo chá que vinha degustando com seu antigo chefe — Eu estou completamente as suas ordens. Na verdade já a aguardava há algumas horas. Sua reunião com os anciões será amanhã pela manhã e como deve saber, ficará em minha casa esta noite sobre minha vigilia. Tenho que deixar claro, nem seus pertences e nem os seus criados irão conosco, seremos apenas nós e uma guarda mantida a certa distância composta por caçadores da ANBU. Assim que estiver pronta podemos ir.

A garota degustou seu chá sem muita pressa enquanto colocaram sobre a mesa as suas reclamações acerca de pessoas mais velhas decidindo sua vida antes mesmo que pudessem conhecer e considerar outras variáveis. Amano era uma jovem bela e delicada, mas possuía tantas fibras quanto qualquer kunoichi que Saito já havia conhecido em todos os seus dezesseis anos. Em determinado ponto de seu dialogo, é bem provável que tenha ocorrido uma ligação entre os dois, que apesar de ter quase uma década de diferença entre suas idades, se entendiam muito bem na medida do possível.

— O chá estava estupendo! — Indagou a moça agradecida enquanto devolvia sobre a mesa o pires com a xicara vazia — Podemos ir? — Completou, tendo como resposta o levantar de Saito — Como quiser — A moça levantou-se e aguardou parada pelo próximo direcionamento do Uchiha que curiosamente abriu a janela — Meus homens irão explicar a situação aos seus criados. Os caçadores já estão a postos em torno de minha residência, não fica muito longe daqui. Para evitar a resistência que certamente nos será oferecida, acredito que possamos escolher uma saída alternativa. O que acha? — Saito jogou-se para fora do lugar, transpassando a janela em um avanço acrobata. Estendeu a destra para a garota que sorriu — Finalmente alguém que sabe me divertir.

Assim que ambas as mãos se tocaram, Saito abusou de toda sua capacidade física para tirar do interior do cômodo a jovem protegida, que transpassou pela janela como se fosse habitual dos dois fazerem aquilo. Era completamente genuína a ligação que haviam estabelecido em tão pouco tempo, mesmo que se mantivessem alheios aquilo. Não por muito tempo — Você consegue me acompanhar? — Indagou Saito, lado a lado com Amano — Como assim? Acha que eu não tive nenhum tipo de treinamento? — Retrucou em meio a um sorriso enquanto mostrou ser minimamente versada na arte de movimentação rápida utilizada por shinobi.

A garota avançou em um movimento acrobata para o topo de um poste próximo do telhado em que estavam — Você consegue me acompanhar? — Seu tom era irônico e abastado de bom humor. Aquilo atraía o jovem Uchiha, que por sua vez saltou na direção do fio ligado ao poste, se equilibrando rapidamente sem demasiado esforço — Me siga — O garoto então partiu entre movimentos repletos de um molejo ligeiramente atraente na direção de onde ficava sua residência. O lugar era consideravelmente modesto e não continha mais de um quarto. Metraton era a única companhia de Saito já havia um bom tempo, desde o falecimento de seus pais. O felino era responsável pela recepção que se daria assim que o casal chegasse a tal residência.

Os mirabolantes e bem orquestrados saltos dos dois guiaram-nos rapidamente ao lugar. Saito morava numa casa que ficava no topo de um dos prédios que rasgavam os céus da folha. Nenhum dos ninja especialistas em ocultar seus rastros haviam sido percebidos pela jovem a ser protegida, mas o sharingan era mais complexo de se enganar. O Uchiha conferiu todos os que identificou e sentiu-se muito seguro ao saber que ao menos dez caçadores da ANBU estavam apostos e completamente engatilhados naquela que seria uma não tão preocupante vigília. A porta estava trancada e com a chave que dispunha entre as dobras de suas vestes o rapaz a abriu.

Saito deixou, cordialmente, que Amano entrasse em sua frente — A casa é simples, mas aconchegante, posso garantir — Logo assim que viram-se no interior, Metraton saltou de sobre a poltrona marrom disposta na sala e jogou-se contra os pés da visitante, recebendo-a de bom grado. A menina sorriu e abaixou-se para colocar o felino entre seus braços — Ele é lindo! Como se chama? — Saito estava trancando a porta enquanto a jovem o questionava. O sujeito deixou as chaves sobre um balcão que dividia a sala de estar e a cozinha — Metraton. É meu companheiro mais antigo e pelo visto gosta de você.

Enquanto a garota, carregando o gato negro e manhoso de Saito, dirigia-se até a poltrona escantilhada e se sentava afagando o animal, o Uchiha dirigia-se até cada uma das janelas dispostas na residência e checava cada uma delas a fim de precaver-se de possíveis invasões, mesmo com a casa sendo vigiada desde muito mais cedo naquele dia por ninjas consideravelmente capacitados para aquilo. O ritual era algo inevitável. Saito não havia vivido tantos anos e ascendido tão rapidamente na força policial sendo um mero garotinho descuidado. Pelo contrário, era desconfiado em demasia e uma prova disso era o fato de seus olhos se manterem sob o uso da técnica ocular que herdou em seu sangue.

— Está com fome? — A figura saiu do corredor e contemplou a mais jovem senhora feudal retirando as partes mais pesadas de suas vestes oficiais, em busca de trajar algo mais casual que pudesse condizer com o ambiente em que estava — Faminta! O que vai preparar pra gente? — As roupas dobradas e colocadas sobre o criado mudo expressavam bem a educação que havia recebido e levantavam na mente do Uchiha um questionamento simples acerca do passado da jovem. Quando será que aquela bela jovem havia deixado de ser alguém passiva de ser considerada comum e tornou-se relevante na linha de sucessão? Não era algo fácil de identificar.

Tanto Saito quanto Amano gargalhavam enquanto falavam sobre coisas da vida, como se aquele fosse apenas mais um dia rotineiro na história dos dois. Falaram dos mais variados assuntos enquanto o Uchiha se esforçava para preparar mais uma das receitas deixadas por sua mãe. O yakisoba da família era considerado por todos que provavam como sendo da mais alta classe e de um sabor indescritível, todavia, Saito não tinha qualquer propriedade para falar tal coisa, tendo em vista sua completa incapacidade em sentir sabores e até mesmo odores — Olha, tem uma coisa que você precisa saber — Seu tom tornou-se sério rapidamente, como se tivesse algo importante a dizer.

— Você vai precisar provar a comida enquanto eu faço, porquê eu não consigo sentir o gosto de nada — A frase antecedeu um sorriso genuíno por parte do rapaz enquanto que Amano arregalou os olhos em surpresa — Você ta brincando! Né? — Retrucou incrédula. O Uchiha seguia rindo como resposta, deixando claro que estava de fato dizendo a verdade — Devia ter me dito antes que eu teria preparado o jantar! — Exclamou enquanto ria junto do jovem aspirante a cozinheiro — Prometo que vai ficar bom, to seguindo a risca a receita da minha mãe — O ar que pairava pela casa climatizava o ambiente com um toque sutil de um sentimento a muito tempo esquecido.

A refeição não demorou muito tempo para ficar pronta. Amano sentada à mesa aguardava por ser servida, não como uma líder, mas como convidada. Saito havia insistido por isso. O rapaz alocou sobre a mesa uma tigela contendo o yakisoba que preparou com tanto carinho que até mesmo nos dias atuais lhe surpreenderia. Arrastou pela mesa o par de hachi para que a moça se deliciasse com a refeição. Fez o mesmo do seu lado da bancada — Bom apetite! — Indagaram ambos quase que ao mesmo tempo, o que foi mais um motivo para risos frouxos.

A jovem agradeceu pelo alimento e cansou de elogiar, eloquente acerca da capacidade de Saito de preparar um prato tão saboroso mesmo sem conseguir sentir qualquer gosto ou cheiro mediante suas próprias limitações. O Uchiha guiou a moça até o quarto, onde a mesma pediu que ele ficasse um pouco mais para que continuassem conversando. Saito se manteve respeitoso, mas por descuido acabou adormecendo sobre as pernas da líder, que apenas consentiu e junto de seu protetor, dormiu. As horas que os separavam do raiar do dia foram preenchidas com diversos sonhos quase que compartilhados nos quais ambos acordavam durante a noite e debruçavam-se em uma noite quente de amor. Para o mal ou para o bem, naquela noite em questão, ficaram apenas nos sonhos tais desejos.