Antes da grande viagem para execução da tarefa designada pelo Kazekage, estive em minha residência realizando algumas cautelas de praxe. A limpeza e culinária acabou ficando por minha conta após a invalidez de minha mãe, e confesso que não me incomodava em fazê-los. Meu pai já havia saído de casa cedo, provavelmente para beber em algum canto, me fazendo suspirar por vê-lo cair em tanta decadência sem poder fazer nada a respeito…

Estava a finalizar a última tarefa quando ouvi o som dos bicos do corvo na minha janela. Sabendo bem do que se tratava, bufava em tom exaustivo, abrindo o vidro para que o maldito pássaro me entregasse o pergaminho com as instruções. — Agora xô, xô! — O afastava com um dos braços, enquanto me virava para observar o conteúdo da tarefa. Arregalava os olhos ao verificar que se tratava de uma missão de Rank B. Na verdade, duas! — Só espero não sair todo quebrado igual ao Cabeça de Mamona. — Dizia em tom baixo, enquanto lia.

E notava que aquela maldição de lidar com crianças me seguia. Um moleque, provavelmente um dos trombadinhas que andavam com os que somem o tempo todo no labirinto no deserto, havia se apossado de um importante pergaminho. O fato de ser um órfão e que provavelmente fez isso para chamar atenção me levava a compreender de que não deveria utilizar a força para o cumprimento da tarefa. — Uns cascudos nunca fizeram mal pra ninguém. — Com os equipamentos devidamente guardados em minha bolsa, saía de casa rumo ao orfanato para maiores informações.

Histórico:

Nunca havia ido ao orfanato, então havia sido difícil encontrá-lo num primeiro momento. Até mesmo algumas pessoas do bairro não sabiam mencionar com exatidão para onde era, me obrigando a caminhar sem direção até que houvesse alguém que sabia sobre isso. Um senhor ficava feliz em me contar, dizendo que seu filho havia sido adotado de lá, e que hoje em dia era um grande homem e tudo mais. Agradecia a direção indicada, seguindo até uma construção modesta, de apenas dois andares com uma placa indicando o nome do lugar. — Instituto Saint Claire… Deve ser aqui. — Mencionava antes de entrar.

Logo na entrada, um extenso corredor levava a diversos cômodos, mas uma ante sala levava os visitantes até uma recepção, onde diversas cadeiras e um balcão estavam à disposição. Havia um casal sentado ali, super apreensivos e animados, provavelmente prestes a conhecer seu novo filho. Me dirigia até o balcão após passar por eles, me frustrando pelo fato de permitir apenas que meu rosto ficasse aparecendo. — Yo! Vim saber se o Nitsu está por aqui. — A mulher do outro lado do balcão olhava para mim, largando uma prancheta. — Huuh! É algum amigo dele? — Uma veia saltava minha têmpora, furioso por ser confundido com uma criança. — O que quer dizer com isso?! Está me chamando de tampinha?! — Quase pulava por cima do balcão.

Após longos pedidos de desculpa, a funcionária começava a mexer nas papeladas, tentando verificar algo sobre algum Nitsu. Depois de um breve tempo, com um olhar apreensivo, ela pedia para que a seguisse… O que exatamente estava acontecendo?


[spoiler=Histórico]

Histórico:

Seguia a funcionária do orfanato por longos corredores. No caminho, consegui ver algumas salas de aula, dormitórios e refeitórios. Algumas crianças seguiam de um lado para o outro, brincando, conversando ou fazendo suas tarefas. Apesar de ver boa parte delas contentes e brincalhonas, dava para notar um olhar vazio em uma ou outra, me dando um aperto no peito ao imaginar a solidão que sentiam por ali.

Meu caminho acabava se dando numa sala de uma das secretárias do orfanato. A mulher, já na casa de seus 50 anos, estava terminando de conversar com uma criança quando chegamos. Precisei aguardar um pouco até que o espaço fosse liberado, onde pude entender o motivo de tamanha formalidade. — Me chamo Gwyn, e vim saber do Nitsu. Soubemos de um furto de um item importante que precisa ser recuperado. — A secretária suspirava ao ouvir o nome, guardando alguns documentos que tinha em sua mesa, demonstrando já saber a situação de cabeça. — Oh, meu querido… Nitsu é um rapaz talentoso, que sonha em um dia se tornar um herói, acredita? — Ela dizia com ternura, e eu escutava com calma.

Ela suspirou mais uma vez, balançando a cabeça em negação. — Ele não é um menino mal, apenas perdido. Se puder colocá-lo de volta no caminho… Talvez demonstrá-lo o que é ser um verdadeiro shinobi, talvez ele sossegue. — Ela então puxou uma pasta de uma gaveta, entregando para mim um trecho de jornal. Ele mencionava um incêndio que ocorreu há dois anos atrás após um dia intenso de calor. Desde então, após a morte de seus pais, Nitsu acabou indo para o orfanato, visto que nenhum outro parente veio a ser localizado. O jornal mencionava o endereço do lugar também, que era bem perto de onde eu morava. — Quando Nitsu faz alguma besteira, ele costuma se esconder nos destroços da casa. Talvez encontre o que precisa por lá.

Histórico:

As informações eram mais impactantes para mim do que eu demonstrava. Eu ainda vivo na pele e tenho todos os dias a lembrança do acidente que aconteceu em minha casa quando olhava para meus membros faltantes. O agravante dessa história era que eu havia sido o causador do problema, e desejava do fundo do coração que o menino não fosse responsável pelo incêndio. — Eu cuido dele. — Comentava, saindo da sala a passos apressados. O caminho para mim era familiar, afinal estava perto de casa. Lembrava-me das notícias cerca de dois anos atrás, então acabava partindo para lá, me surpreendendo por encontrar a casa ainda em estado de demolição.

Minha entrada era silenciosa, e em meio a todo o carvão e cinzas, um soluço abafado me captava a atenção. Seguia pelos degraus do que seria uma espécie de porão, até ser surpreendido com uma adaga que vinha em minha direção. Uma esquiva ágil veio a ser necessária para escapar ileso, mas deixando um corte em minha bochecha. Olhando para o lado, notava o garoto oculto em um canto, claramente apavorado, enquanto abraçava um pergaminho do tamanho de seu tronco de tons escuros e dourados. — Ei, isso podia ter me acertado, moleque! — Mal terminei de falar e o garoto saiu correndo, saltando dali como um exímio ninja, arremessando shurikens para trás para tentar me despistar.

Não imaginava que minha chegada seria recebida daquele jeito. Acabei precisando correr atrás dele por um quarteirão, até conseguir prendê-lo em galhos de árvore que deram conta de segurá-lo em segurança. Quase como se o mantivesse em uma gaiola, sentaria no lado, olhando para cima, em direção da lua vermelha que começava a surgir no céu. — Na sua idade, eu estava longe de arremessar shurikens assim… Já pensou em ser um herói, garoto? — A menção captava sua atenção, freando a sua fúria momentaneamente.

Perdia o tempo que havíamos passado por ali, mesmo após libertá-lo. A bem da verdade era que, assim como as suspeitas, o garoto só precisava de um pouco de atenção, de ser compreendido. A questão era que ninguém estava de fato preocupado em ouví-lo e dizê-lo o que ele precisava ouvir. Ao fim de tudo, sentia que havia até mesmo ganho um pupilo, além do pergaminho para terminar com a maldita missão.

Histórico:

Perdia a noção das horas após as longas conversas com Nitsu. Falávamos sobre aspirações, sonhos, medos e solidão. Precisei compartilhar muito com ele, mas acabou me fazendo bem também de uma maneira indescritível. Quando a noite enfim chegou, o levei de volta ao orfanato, prometendo visitá-lo com frequência e ajudá-lo a treinar, para que utilizasse suas habilidades com mais sabedoria. O pergaminho acabava sendo entregue e nem mesmo tive oportunidade de saber seu conteúdo… De qualquer forma, não tinha muito tempo a perder. Era necessário seguir para a próxima tarefa.

O relatório mencionava que a Srta. Aragaki, uma promissora atriz que veio morar em Sunagakure por questões de segurança, estava sendo ameaçada por um “admirador secreto”. Imaginava que naquela tarefa eu ao menos seria capaz de colocar um pouco mais de ação em prática, partindo para o local mencionado sem muito esperar. A região onde a Srta. Aragaki morava era uma área nobre na vila, onde apenas grandes figurões viviam por lá. A segurança do lugar era reforçada por conta dessa variável, então era estranho alguém ter feito tanto alarde. Até mesmo minha presença na região era notada, sendo conduzido até a casa onde minha missão se iniciaria.

A mansão da família Aragaki era chamativa, sem sombra de dúvidas. A quantidade de janelas abertas dava o sentimento de exposição para quem vivia no interior. Talvez fosse exatamente esse tipo de coisa que ela gostaria? — É terrível, terrível! Na última vez, esse maníaco deixou um gato morto em minha janela! — Ela relatava aos prantos, de forma bem teatral. De fato, a mulher era muito bonita, me fazendo perder o olhar muitas vezes ao olhá-la diretamente. — Bem… Gente desse tipo sempre volta. Façamos o seguinte: dispense o reforço da guarda e me deixe de vigia essa noite. Assim ele se sentirá motivado a voltar. — O plano parecia agradá-la. Em pouco tempo, todo o policiamento do local ia se dispersando, deixando apenas nós dois naquela gigantesca casa.

Histórico:

Era desconfortável ter que ficar observando alguém tão extravagante, que fingia não estar sendo observada para viver a vida de uma forma teatral. Até mesmo sua ida para a cozinha para pegar água era toda dramática, cheia de movimentos graciosos, como se estivesse de frente para uma platéia. Eu observava desgostoso, achando uma piada tanto esforço pra nada. — Bem, fui contratado para vigiá-la, não para assistir sua rotina. — Voltava minha atenção para o lado de fora.

Estava localizado no telhado agora, ao invés do interior da casa. Oculto pelo jutsu de camuflagem, observava tudo sob uma ótica privilegiada. Pelas primeiras horas, nada ocorria exatamente. Notava as luzes das outras casas se apagando, bem como a da Srta. Aragaki, imaginando que havia ido dormir. Cerca de uma hora se passava após isso, comigo tendo uma batalha árdua contra o sono, até que algo despertava minha atenção.

Um vulto pareceu se mover dentro de um beco próximo, entre duas casas de alta classe. Me erguia, tentando vê-lo melhor e, ao olhar para a porta de entrada da Srta. Aragaki, notava um embrulho grande, com uma mancha de sangue escorrendo dele. — Merda, ele já veio e foi embora? — Atribuía a minha falha em notá-lo ao sono que havia vencido uma rodada, mas a verdade era que o cara parecia ser especialista em furtividade. E se não agisse rápido, o perderia novamente.

Histórico:

A perseguição dava início comigo saindo na desvantagem. Saltava pelos telhados como a sombra, usufruindo da altitude para me garantir uma visão melhor por onde o perseguidor estaria indo. Talvez por não ter me visto, o sujeito não teria a preocupação de sair com pressa, me dando a oportunidade para alcançá-lo. Claro que minha atenção precisava ser redobrada naquele momento, me dificultando e muito na execução de encontrá-lo.

Em um determinado ponto, acreditava tê-lo perdido de vista. O cara era realmente ágil, e percorria os becos como um felino. Respirava pesado, cansado pela perseguição surpresa, até que notava algo num telhado vizinho. O motivo de não tê-lo encontrado mais pelo chão era por que ele havia subido, e agora pelo jeito havia me notado. — Ei, parado aí! — Já iniciava uma corrida, gerando uma reação instantânea por parte dele.

O cara era mais rápido do que eu, disso não havia dúvidas, mas o seu desespero era visível, mesmo através da máscara negra que tapava toda sua boca e nariz. Ao invés de segui-lo logo atrás, precisando me garantir numa disputa de velocidade, preferi contornar os telhados, saltando pelo interior de uma das casas, saltando por cima de mesas e sofás, para ocultar minha movimentação. Era necessário usar a cabeça se quisesse sucesso naquela caçada.

Por fim, quando o perseguidor acreditava já ter me despistado, eu surgiria próximo dele, utilizando de alguns galhos para me segurar na borda do telhado e me elevar rapidamente. — Huuuh!?! Que tampinha insistente! — Ele dizia, puxando uma espada curta, apontando para mim sem nenhuma hesitação. — Você serviria bem como um presente… Sua pele está nova, e minha amada merece as mais belas peles! — Seu tom de voz maníaco descrevia, de sua própria maneira, o que movia a sua motivação doentia. E, sem nem mesmo me deixar recuperar o fôlego, ele avançava para cima de mim.

Histórico:

A lâmina veio tão ágil quanto o vento, e precisei me esquivar rápido para não ser perfurado na altura da garganta. Utilizava os galhos ainda presos na beira do telhado para me deslocar de maneira imprevisível, contornando o maníaco, que parecia se divertir com meus esforços. — Depois que eu pegar essa sua espada e cortar você no meio, vamos ver quem será o tampinha!! — Gritava, destacando meu maior descontentamento, muito maior pelo desejo dele em arrancar minha própria pele.

O perseguidor avançava novamente, não me dando espaço ou tempo para executar nenhum jutsu antes de precisar esquivar novamente. Rangia os dentes, sabendo que estava em desvantagem num combate corpo a corpo, visto que pouco havia investido meus treinamentos em Taijutsu. Por isso, acabava tentando preparar alguns selos entre as esquivas, mas com frequência acabava sendo interrompido. — Não se mexa muito… Ficará mais doloroso retirar sua pele. — Ele dizia em meio das gargalhadas quando sua lâmina, de raspão, acabava atingindo meu ombro, deixando um fio de sangue sair pela abertura.

Recuava um pouco, tentando ganhar espaço e oportunidade, mas ele ainda assim avançava contra mim. Começava a execução dos selos e, no instante final, interrompia a execução do jutsu para parar o golpe certeiro, que vinha com tudo em direção ao meu rosto… Sendo interrompido pelo meu braço, que se colocava na frente.

Com tamanha força, com toda a certeza meu braço seria decepado e meu rosto também acabaria sendo atingido. A questão era que o atacante desconhecia o fato de que havia um membro de aço dentro das mangas de minha roupa, permitindo que o golpe fosse parado de forma indolor. — Já era, seu merda! — Com a mão livre, terminava de realizar os selos do jutsu, graças ao treinamento intenso que havia realizado para poder executá-los em caso de inutilização de um dos braços. — Mokuton: Ohanabatake!

O final do combate não foi uma cena nada bonita. Apesar de ser um jutsu de Rank C, seu poder destrutivo era tremendo quando atingia em cheio. As autoridades só chegaram muitos minutos depois, quando o corpo do perseguidor já estava inconsciente por falta de sangue. Soube que depois acabou falecendo, mas sendo possível extrair algumas informações relevantes sobre alguns outros crimes que o mesmo realizou. Os agradecimentos da Srta. Aragaki foram os mais extravagantes possíveis, até mesmo com repórteres fazendo matérias sobre o ato heróico naquela noite. Bem… Para mim era mais uma missão cumprida, mas conseguia compreender agora a diferença de níveis de um rank para o outro.

Histórico: