Kaito treinava suas habilidade incansavelmente no campo de treinamento, como de costume. Nesse dia específico o sol castigava a vila da folha mais do que o comum, de modo que não demorou muito pra que se desfizesse da porção superior de suas vestimentas, revelando seu corpo moreno, suado, e visivelmente mais definido do que era um mês antes, quando começara a treinar sob a supervisão de Kotokami, que o observava de longe com os braços cruzados.

Não havia vento nenhum naquele dia, as folhas verdes da densa floresta que cercava o campo permaneciam paradas, não emitindo o característico som da vegetação balançando ao vento.

– Está progredindo rápido. – Kotokami comentou sem parecer realmente um elogio.

Kaito estava arfante, embora mantesse a expressão determinada. Realizava selos de mão em sucessão e em velocidades incríveis, era evidente que treinava a agilidade das mãos.

– Obri....gado? – Respondeu, sem ter certeza de que o tom de voz do homem remetia a algo bom.

A primeira brisa em muito tempo passou pelos dois, precedendo a fala de Kotokami.

– Os superiores me mandaram uma mensagem hoje. Querem acelerar seu progresso mais ainda. –

Kaito de repente parou de realizar os selos e encarou diretamente seu professor. A preocupação era visível na sua face.

– Mais? Vão me fazer treinar de madrugada também? – deixou seu corpo cair ao chão e se sentou de pernas cruzadas, deixando subir uma pequena nuvem de terra. – Eu estou me esforçando, tá bom? Estou dando o meu melhor. Me fazer ultrapassar o limite do que é um treino saudável só vai atrasar tudo. –

Kotokami respirou profundamente e deu um suspiro de cansaço.

– Não estou falando de treinar mais, detento. Estou falando de treinar com mais inteligência... Pare por um segundo, tenho que explicar uma coisa pra você. –

Kaito já tinha parado, na verdade. Sendo assim só continuou a encarar seu professor enquanto ele explicava:

– Tenho certeza que você já está familiarizado com o Bunshin no jutsu. – O professor fez um selo de mão com a mão esquerda e materializou ao seu lado uma cópia idêntica à sua.

Kaito fez que sim com a cabeça e Kotokami continuou:

– Pois bem, como você sabe, esses clones são intangíveis e não podem realmente fazer nada além de... bom, serem vistos. Eles não são materiais. O que você provavelmente não sabe é que na verdade existem vários tipos de clones. Clones elementais, clones da sombra e por aí vai. –

Kaito fez um lançou um olhar pensativo e interrompeu.

– Nunca ouvi falar sobre isso, qual a diferença entre eles?

– Clones da sombra são clones físicos feitos a partir do chakra do usuário, clones elementais são clones criados a partir do elemento de chakra de seu usuario. Você, por exemplo, provavelmente seria capaz de utiliza um Mizu Bunshin no Jutsu, ou seja, clones feitos de água. Está entendendo, detento? –

Kaito continuava com seu olhar pensativo, mas não parecia querer interromper o raciocínio de Kotokami, e sendo assim, acenou com a cabeça para que continuasse.

– A principal diferença entre esses clones e o que eu criei é que esses tipo de clones são tangíveis, ou seja, podem lutar ou realizar qualquer atividade que o seu usuário quiser, contanto que treine o suficiente para manter controle sobre eles...

Kotokami fez uma pausa em sua fala, a qual Kaito aproveitou para lhe perguntar.

– Certo, mas o que isso tem a ver com acelerar meu aprendizado? Quer dizer, é uma técnica útil, sem dúvidas, mas ainda não vejo a correlação.

– Todos os conhecimentos adquiridos por um clone são absorvidos pelo usuário da técnica quando ele se desfaz, ou seja...

A expressão duvidosa de Kaito se clareou.

– Se eu criasse dois clones, conseguiria me desenvolver duas vezes mais rápido... Incrível... – Kaito o interrompeu.

Kotokami se abaixou e alcançou um pequena bolsa que estava no chão, aos seus pés. De lá, retirou um pergaminho e caminhou até Kaito, entregando-o em sua mão.

– Então hoje vou aprender a criar um clone de água, certo?

– Errado. – Kotokami respondeu categoricamente, deixando Kaito visivelmente confuso.

– Não entendi, qual o objetivo de toda essa conversa então?

– Criar clones a partir de chakra envolve um grande controle, imagine ter que coordenar duas versões de si mesmo ao mesmo tempo. Tendo a mim como professor, você conseguiria, mas o tempo que isso iria levar comprometeria todo o intuito de acelerar o seu treinamento.

Kaito enfim se levantou, com o semblante inundado em dúvidas novamente.

– Então... O que vamos fazer?

– Existe um outro tipo de técnica de clonagem, um pouco... Diferente...

Kaito levantou a sobrancelha.

– Como assim diferente?

– Não se trata de criar uma cópia de si mesmo a partir de chakra, mas sim de dividir seu corpo fisicamente em dois, criando duas cópias independentes de si mesmo. Isso nos pouparia o importuno de te ensinar a controlar cada uma de suas partes.

Kaito fez uma careta.

– Me dividir? Tipo... Em dois?! – Estava um tanto quanto incrédulo. – Isso não é tipo... perigoso? –

– Não se você fizer do jeito certo. Agora anda. – Ordenou Kotokami.

Kaito decidiu poupar suas palavras, engoliu em seco e desamarrou o barbante que prendia o pergaminho.

Dentro dele havia uma série de instruções complicadas sobre como manipular a estrutura do próprio corpo usando o chakra para dividí-lo em dois. Tudo aquilo envolvia termos técnicos combinações de conceitos avançados. Kaito conseguia entender a metodologia por trás, mas somente o suficiente para ter uma noção de que dominar aquela técnica lhe demandaria muito esforço.

Passaram-se uns bons 10 minutos em que Kaito lia o pergaminho antes de acenar para Kotokami que o havia terminado.

– Entendeu a pegadinha? – Respondeu Kotokami brevemente

– Sim. O texto não deixa isso claro, explicitamente. Mas me dividir física e espiritualmente vai demandar que minhas capacidades físicas e espirituais também sejam divididas, não é mesmo? –

– Sim, mas essa não é a única questão. Você deve entender que cada cópia sua é uma versão física de você, literalmente um ser único, diferente de um clone comum. Isso significa que se um de vocês morrer, metade de suas capacidades estará perdida para sempre. –

A brisa passou pelos dois, e Kaito fez silêncio por um tempo antes de dizer insatisfeito.

– Imagino que você não esteja me ensinando isso para ser usado em qualquer situação. –

– Exatamente, somente em treinamento comigo, ou quando a situação for extremamente necessária. Em ambos os casos, você deve ter cuidado máximo para evitar quaisquer riscos, ou as consequências serão irreversíveis.

– Sim, senhor... – Kaito fez que sim com a cabeça mais uma vez, e esse simples gesto marcava o inicio de sua jornada para aprender a técnica e clonagem.

**

Ao contrário de como fizera com as outras técnicas que tivera de aprender até agora, Kaito mostrou dificuldade em se adaptar com a clonagem de seu corpo. Durante os primeiros dias, sequer conseguia produzir algum efeito, no terceiro dia contudo, conseguiu reproduzir a parte superior de seu corpo, que não se separou por completo, gerando uma cena bem estranha.

No quarto dia, Kaito Treinou a técnica incansavelmente ao lado de Kotokami, que o observava com seus olhos julgadores. Depois de um dia inteiro de atividades intensas, as estrelas se projetava acima dos dois, jogando sua luz pálida sobre as folhas e a grama do campo de treinamento e traçando a silhueta do jovem Kaito e de seu professor em lados opostos do campo, encarando-se com uma força invisível separando os dois.

– Descanse. – A voz de Kotokami cruzou o ar do campo de batalha como uma navalha.

Aproveitando a deixa, Kaito deixou seu corpo despencar em direção ao chão, observando o céu estrelado acima de si com um semi-sorriso no rosto.

– Consegui separar o clone completamente do meu corpo hoje. O que achou? Bem incrível, né?

Kaito não obteve uma resposta. De repente seu olhar se fechou, como se a visão das estrelas tivesse lhe trazido algo ruim a tona.

– Senhor... Queria lhe fazer uma pergunta.

– Uma pergunta? * Hmpf * estamos treinando juntos há semanas e você não disse essa frase uma única vez. Então... Qual a sua pergunta? – Disse o homem, alguns metros à frente de Kaito.

– Vocês pesquisaram tudo sobre mim, né? Todo o meu passado, eu digo...

Kotokami se remexeu de leve, parecia desconfortável, como se entrasse em território perigoso.

– Naturalmente. Por que a pergunta? – Kotokami disse, desconfiado com a guinada repentina para o assunto.

– Então vocês sabem dele, né? Do Ken eu quero dizer. –

Kotokami fez um suspiro insatisfeito e andou até Kaito. Sentou-se ao lado dele do mesmo jeito que o garoto sentara, deixando seu corpo cair ao chão.

– Eu saberia disso mesmo que não tivéssemos vasculhado a sua vida toda antes de decidir te soltar. É o meu trabalho sabe... Mas porque está me perguntando isso agora?

– Por nada, é só que... Bom... Nada. Eu me lembrei dele, é só isso.

Kotokami observou o garoto, parecia pronto pra protestar mas optou por ficar quieto, pelo menos por alguns momentos. Passados alguns segundos de silêncio desconfortável entre os dois, Kotokami elaborou.

– Bom, isso é assunto confidencial, não posso e nem quero conversar sobre. – disse se levantando. – Amanhã, mesmo horário, vamos continuar o seu treinamento nessa técnica. – E começou a ir embora.

– Espera! – Kaito o chamou pelas suas costas, erguendo-se do chão. – Eu acho que só estava cansado, e por isso não consegui. Mas agora eu estou bem, olha. –

Kaito então fez uma rápida sequencia de selos mão que fora seguida por um estranho fenômeno. Uma figura idêntica a si se projetava para fora de seu corpo lentamente. Quando se desprendeu de sua forma original, tocou os pés no chão e cambaleou de maneira desajeitada. Kotokami parecia consideravelmente perplexo, o talento de Kaito era incrível, mesmo que ele não quisesse admitir.

Depois que a duplicata parou de cambalear e finalmente se firmou no chão, permaneceu imóvel com o olhar para baixo por alguns segundos, antes de elevar seu rosto para Kotokami com um sorriso provocador estampado na face.

– Bom o suficiente? – a cópia disse.

– Veremos. – Kotokami declarou, rapidamente levando a mão aos bolsos e sacando uma shuriken.

O policial a arremessou em alta velocidade em direção ao ombro direito da cópia, que explodiu em uma massa de água ao entrar em contato com a arma, voltando ao seu formato normal logo em seguida.

– Suika no Jutsu, né? Parece que esse realmente é um clone completo com suas capacidades. – Kotokami Levou a mão ao queixo por um segundo e pensou em algo. – Acho que não faz sentido insistir nesse jutsu à esse ponto, o resto vai vir com a prática. Muito bem, a partir de amanhã vamos focar em outra coisa, ou melhor, outras coisas, se prepare para trabalhar em dobro agora que há dois de você.

A duplicata de Kaito andava até o garoto e, como num passe de mágica, atravessava-o ao entrar em contato físico, se reintegrando ao corpo original.

– Bem como eu pensei que você diria, pois bem. Estou ansioso para ver o que tem guardado para mim.