I




　No alto da vastidão da qual era composta o firmamento, os primeiros raios solares já se faziam perceptíveis. O cantar dos pássaros era completamente desinibido e proporcionava um bom humor matinal a qualquer um que fosse minimamente decente. Na residência de Saito, que apesar de solitária - e quase sempre deixada ao acaso enquanto o proprietário dedicava-se a conclusão de suas missões - mantinha-se bem organizada e passava a impressão de ser bem cuidada, o jovem se levantava e caminhava por entre os corredores se espreguiçando e bocejando a fim de espantar completamente os resquícios da noite de sono que teve.

　　— Bom dia, Metatron! — Indagou com uma voz sonolenta e arrastada, mas carregada de entusiasmo, ao felino que se aproximava em busca de carinho auto imposto ao se chocar contra as pernas de seu dono. Continuou andando.

　　Seu destino, rotineiramente o mesmo. Dirigiu-se até a bancada da cozinha e tateou sobre a mesa com os olhos entreabertos até que encontrou o que procurava, não antes de derrubar um ou dois frascos que por sorte estavam tampados. Em sua destra agora carregava o pequeno pote com pó de café enquanto buscava com a canhota a panela que já não refletia um misero lampejo após tantos usos. A penumbra que reinava nos cômodos era pouco a pouco subjugada pelos poucos feixes de luz que conseguiam se esgueirar pelas frestas das janelas ao redor do ambiente e passavam um clima alegre e arrojado, mesmo que tão solicito.

II




　O odor agradável e convidativo se espalhou pela casa e para os mais desavisados que passavam ao lado da residência também se fazia perceptível. Ao mesmo passo, acompanhando o fumo singelo que evadia do pequeno bico na panela, o som do assobio anunciava que o café estava pronto e porquanto Saito não tardou em retirar Metatron de seu colo e levantar-se da poltrona avermelhada onde tantas vezes seu pai se sentou para contar-lhe acerca de seus feitos e realizações em missões pela aldeia, era uma lembrança boa. Os passos que se seguiam eram vagarosos, lentos e compassados, entretanto, muito mais despertos.

　　Diante da chaleira, desligou o fogão com a destra e com a canhota segurando na alça do recipiente fez questão de despejar suavemente o liquido em uma caneca branca com inscrições motivadoras como "este dia é seu, vá em frente e encare-o". Soprou algumas vezes e debruçado sobre o balcão saboreou seu café sem açúcar tão característico, tendo em mente sua completa falta de papilas gustativas. O felino saltou do solo e se pôs também sobre a bancada, o que acionou um gatilho na mente de Saito. O rapaz deixou por um instante seu café sobre a superfície e buscou em um dos armários da cozinha a ração do animal, despejando-a na tigela do mesmo que avançou agradecido contra o vasilhame. O café estava servido para ambos.

III




　Três batidas secas ecoaram pela casa, advindas da entrada. Em um primeiro momento ressoou em sua mente o questionamento acerca de quem seria à porta, mas logo concentrou-se em descobrir por conta ao invés de esperar que se anunciasse por escolha própria. Ao abrir a porta, contemplou a figura de um mensageiro, como de se esperar, vestido a caráter. Para chamados especiais o conselho da Folha costumava enviar um shinobi de classe superior, como chunins, encarregando-os de encontrar aqueles que seriam incumbidos da missão em si, normalmente jonins. Para situações mais fáceis de se controlar e que iriam requerer alguém menos capacitado, como chunins e tokujos, enviavam estudantes e genins.

　　— Bom dia, garoto. O que houve? — Questionou Saito ao menino que não aparentava possuir mais de doze anos. Claramente um genin formado há pouco tempo relativamente descontente com o trabalho pífio do qual foi incumbido.

　　— Mandaram entregar uma missão pra você. Não é uma grande calamidade mas é importante que você resolva a situação logo, antes que saia de controle — O menino respondia rapidamente e mostrava estar atento ao que lhe fora dito para repassar. Saito estendeu a canhota e recolheu das mãos do mais novo o pergaminho que viria a conter os dados mais específicos acerca de sua tarefa atual.

IV




　Com o documento em mãos e dispensando o garoto das mensagens, virou-se para o interior de sua residência uma vez mais e fechou a porta pela qual havia recebido a missão. Caminhava, agora mais apreensivo e objetivo, na direção de seu quarto onde colocaria suas vestes de cunho profissional ao invés do traje atual, resumido a uma calça folgada e de tecido macio acompanhada da branco-encardida regata que usava rotineiramente ao dormir. Simplificando: o pijama.

　　Até chegar no recinto já havia aberto as escrituras e rolado por cima os olhos, entendendo superficialmente o caso. Em tese, tratava-se de uma busca e apreensão do sujeito ainda não identificado que estava espalhando papeis explosivos por diversos pontos da aldeia. Até então, por não ter tido o centro como alvo, nenhuma pessoa de fato havia se machucado, o que abria um leque de chances para que o mesmo fosse parado a tempo de não acabar cometendo um homicídio.

　　De seu guarda-roupas retirou uma calça preta que chegava até seu tornozelo. Junto da mesma calçou suas botas ninja padrão da mesma cor, a qual a grande maioria dos shinobi da Folha utilizavam rotineiramente. Sobre o tronco, uma regata-colete de cor preta e de material resistente, por baixo de uma camisa branca de botões que se fechava ao meio e possuía mangas longas. Estava pronto para iniciar sua busca e com isso saiu pela janela como um gatuno.

V




　Do alto de um dos postes dispostos no centro da aldeia, não muito distante de onde estava anteriormente, Saito observava a aparentemente pacata vila. Muitos se mantinham alheios aos atentados terroristas que vinham acontecendo nas redondezas do lugar, crentes de que sua segurança era absoluta e que a proteção concedida pelos shinobi prevalecia ante qualquer malfeitor. Todavia, de maneira alguma era assim tão verdade. O fato é que como ninjas de alto rendimento eram sim capacitados para antever acontecimentos como aquele, todavia, quando os criminosos detém treinamento e capacidades intelectuais avantajadas para utilizarem ao seu favor no que concerne a fazer o mal, a coisa ficava mais complexa.

　　Era, em todo caso, responsabilidade de Saito resolver aquela situação. Não vendo-se com tempo para desperdiçar, começou a traçar um perfil para quem poderia estar acometendo contra a sua própria vila. Pela descrição dos atos, não havia um padrão totalmente claro para estabelecer, mas no fim das contas, teria de ter. Como primeiro ato buscou tomar como rumo a localização onde aconteceu o primeiro causo. Para sua sorte não despenderia de demasiado tempo para chegar até lá. Em míseros minutos encontrava-se diante do que havia restado da explosão. Aparentemente o papel bomba havia sido alocado na quina da parede de um estabelecimento, que por sorte estava fechado durante o ocorrido, visto que parte da construção estava completamente destruída. Era por ali que iria começar a estudar seu adversário.

　　Por obra do destino, fez-se possível ouvir uma explosão não muito distante de onde estava. Ergueu a destra e agarrou uma barra de aço utilizada para sustentar uma lona que cobria a fachada da tal loja, utilizou-a para se impulsionar acima dos prédios e sobre os mesmos começou a se dirigir até o local. Chegando no mesmo, encontrou algumas pessoas em volta de um sujeito que havia perdido os dedos durante a combustão do papel. Após algumas perguntas objetivas, ficou claro que aquela se tratava de uma obra do carma instantâneo. O sujeito sem os dedos era ninguém mais, ninguém menos que o próprio terrorista. Seu último ato não saiu como planejado e acabou explodindo a si mesmo. Saito escoltou o homem sem dedos até as autoridades responsáveis e finalizou sua missão mais cedo do que esperava.