As gotas de chuva batiam no vidro do gabinete do Raikage. Era uma chuva pesada, mas eu estava lá, ainda sentado em minha cadeira, com os cotovelos apoiados na mesa, olhando para o horizonte chuvoso. A lua fazia falta de vez enquanto, não havendo nada para iluminar a escuridão da noite, precisando de equipamentos eletrônicos mais sofisticados para a manutenção da vida noturna da vila, esta que brilhava intensamente. Meus dedos se entrelaçam e encostam em meus lábios. Bocejo levemente de sono, escutar os pingos de chuva era bem relaxante e a exaustão mental do trabalho não ajudava. O tic tac do relógio não incomodava mais, já fazia parte do ambiente.

Apesar da hora, ainda estava presente no gabinete, mesmo que no momento, nada estivesse fazendo, apenas ficando ali parado. Não havia problema ficar até tarde ali, afinal, não havia ninguém me esperando em casa mesmo. Às vezes sinto penas dos ANBUs que devem estar em patrulha e principalmente aqueles que tem a função de proteger o Raikage. Ali fora, na chuva e no frio, protegendo alguém que é dezenas de vezes mais poderoso que eles.

Me reviro na cadeira, refletindo sobre o dia, meus olhares frios recaem sobre o teto e uso meu punho para apoiar o queixo enquanto os dedos da mão esquerda dedilham a mesa lentamente. A sala era tão sombria e gelada e bem solitária no momento. Tão calmo e pacifico. Uma ilusão tão linda do que as coisas poderiam ser, mas eu sei que a tempestade está lá fora, ameaçando todos do meu povo, ansiando para nos dominar. Eu já falhei antes e isso causou uma destruição inimaginável. Algo que não pode se repetir.

O mundo está passando por uma fase obscura e um conflito pode ocorrer a qualquer momento. Meu planejamento do passado foi destruído e a única coisa que posso fazer é aumentar e treinar meu exército para a tempestade que se aproxima. Vendo que a chuva apenas se intensifica, decido sair da minha sala por um estante.

Me levanto, caminhando para fora do gabinete, subindo as escadas do prédio lentamente. O silêncio era ensurdecedor e o único ruido possível de ser escutado eram os passos abafados emitidos por mim, pois totalmente vazio estava o interior do prédio no momento. Degrau por degrau até o topo do prédio. Sinto as gotas de chuva atingirem minha roupa e corpo, escorrendo pela minha pele. Era muito gelado e sentia o vento esfriava meu corpo. Que bom, isso quer dizer que eu ainda estou vivo e são. O prédio era alto e conseguia enxergar os relâmpagos da tempestade relampeando entre as nuvens furiosamente, acertando os para raios as enormes construções de Kumo erguidas após a tragédia, ansiando em atingir o chão. De repente, me dou conta que havia velho ali. Ele estava parado, com as mãos dentro do casaco, olhando para mim.

- Você de novo... – Falo friamente, o olhando com um olhar penetrante e ele apenas sorri levemente. Era Tatsuo, que mais uma vez, aparecia misteriosamente para mim, sendo a ultima vez, a dois anos atrás.

- E então... Como vai garoto? – Ele pergunta causalmente, mas eu não o respondo, continuando a olhar para ele – Hmmmmm... Interessante... Você está diferente... Seu olhar... O que eu previ aconteceu... Ela morreu, não foi? – Ele questiona, acertadamente e eu fico mais um tempo em silêncio.

- Sim... Tem um tempo – Confirmo a morte de Kimi, que não suportou e faleceu a quase um ano atrás. Não consegui salva-la, portanto, foi a última vítima da “tragédia da Nuvem”, a última vítima da minha falha. Lembro da noticia como se fosse ontem. Não derramei uma gota de lágrima, apenas uma frustração e tristeza me abateu e me isolei durante algum tempo. Quando retornei, era como se nada tivesse acontecido aparentemente.

- Eu já sabia... Consigo ver em seus olhos... Um combatente feroz nasceu... Um verdadeiro ninja, sem mais distrações – Tatsuo ri – Devo dar meus parabéns pela conquista – Bate palmas em meio a chuva.

- Me parabenizando pela minha própria desgraça... Que engraçado – Comento, o encarando com um olhar mortal.

- Aposto que se sente vazio, miserável e quebrado, não é? – Pergunta retoricamente - É exatamente isso que eu queria... Sabe... Todos os grandes homens na história tiveram grandes ambições e ideais, sejam eles bons ou ruins... Poder, fama, conquista ou até mesmo, o desejo de se igualarem aos deuses... Mas e você? Como uma pessoa que chegou ao posto de Raikage consegue ser tão simples e direta... Chega ser decepcionante... Porém, ironicamente, é isso te torna único... Não deseja ser um deus, nem demônio, nem anjo, nem herói, nem vilão... Como alguém conseguiu chegar tão longe não tendo “nada”? – Questiona, coçando a nuca.

- Hmpf... Então, se eu não sou esse tipo de homem, então por que estou aqui e agora? Sua lógica não se aplica a mim – Faço o contraponto. Ele era realmente um homem muito irritante, querendo revirar meus pensamentos e o interior do meu coração.

- Um homem que que passa tanto tempo sozinho e não se conhece... Irônico... – Solta uma leve risada – Vou te dizer uma coisa que já deveria saber... Sua força não são os jutsus, não são seus ideais, suas ambições, não é seu treinamento, nem amigos, companheiros ou qualquer baboseira dessas... É algo muito mais especial que vem de dentro do seu coração... – Aponta para mim - É a sua determinação e vontade inabalável... Essa é sua arma mais poderosa... Na iminência da derrota, na beira do desfiladeiro, na borda do abismo, são esses momentos que fazem sua alma brilhar mais que qualquer um... Heh... Não é maravilhoso? Chega a ser poético... – Tatsuo discursa sobre mim.

- Está dizendo que meu potencial máximo é na hora da desgraça? Que eu só fico forte durante o sofrimento? Que tipo de maldição é essa? – Pergunto, ainda sem entender seu ponto por completo.

- Maldição? – Tatsuo cai na gargalhada – Que ponto de vista engraçado... Isso não é uma maldição... Não é o sofrimento que o torna mais forte, nem mesmo a morte de seus amados... É a consequência disso... É a determinação que vem se intensifica, de superar e seguir em frente... É o seu talento... – O velho diz e na mesma hora, vem a imagem da minha mãe. A imagem dela revivida a 4 anos atrás.

Eu coloco a mão na cabeça. Eu finalmente entendi, o que minha mãe quis dizer a 4 anos atrás quando foi ressuscitada. Era ela mesma, mas eu ainda não conseguia a entender. Como eu nunca consegui chegar nessa conclusão? Como eu nunca quis acreditar? Toda minha jornada me guiou até aqui. Minha enorme determinação de perserguir qualquer objetivo me manteve vivo.

- Eu não entendo... Por que? Por que me disse isso tudo? Por que está tentando me ajudar? Por que essa obsessão? – Pergunto, em duvida das intenções dele. Um velho tão misterioso, com ligações com o passado dos meus pais.

- Hmmm... Ora, você é filho da minha aluna mais promissora e vejo um potencial infinito, mas sua cabeça dura e ligações sentimentais impediam você mesmo... Se distraindo com relações fúteis, seu potencial como ninja nunca poderia ser alcançado e além disso... Eu tenho uma certa curiosidade do quão alto você pode chegar antes de queimar suas asas... Muito mais longe que sua mãe... Sem desvios e com o foco certo, sua determinação pode te levar aonde quiser... Erga-se Serafim da Montanha... Tempos ainda mais sombrios batem à porta e você tem que estar preparado... Adeus Nanadaime... Alcance os céus como um poderoso raio ascendente e brilhe mais que todos - Tatsuo levanta a mão e desaparece quando um raio despenca das nuvens, bloqueando a visão por um momento.

Eu olho para o horizonte, vendo minha vila, eu lembro do meu passado, dos meus amigos, daqueles quem já amei. As palavras de Tatsuo, as palavras da minha mãe e de todos que passaram pela minha vida. Elas renovam minha mente. Talvez, esse vazio que exista em meu peito nunca possa ser preenchido como antes. Porém, mesmo se eu estiver quebrado, recolhei meus pedaços e seguirei em frente até o fim. Por que esse é quem eu sou. Um espirito imparável e indomável.

O que estou fazendo esse tempo todo? Preso em minha própria melancolia... É hora de voltar ao jogo. Caminho de volta para dentro do gabinete, pois é hora, de retomar o controle.

Considerações: