Ashtar veio de uma família pouco tradicional.

Não havia uma mãe. Porém, havia um pai. Foi dele que herdara a sua kekkei genkai, e foi dele que, primeiramente, ouviu sobre todas as desgraças que o seu poder poderia lhe proporcionar. Era um bom homem, e se esforçava para ser um bom pai — mas geralmente falhava. Costumava passar mais tempo fora de casa, à trabalho, do que nela e, mesmo com os esforços para ser presente e afetuoso, o cansaço sempre vencia; sempre o roubava.

Havia um irmão, cheio de energia e atitude — e um toque de crueldade que Ashtar invejava. Ele nunca se sentiu acolhido por aquela vida; aquela vida normal, chata e entediante. Desejava aventuras. Ela e seu irmão tinham nascido no mesmo dia, portanto, eram fisicamente idênticos. Mas, por dentro, não poderiam ser mais diferentes.

Havia um avô. Ele era quem alegrava os dias de Ashtar, além de enchê-la de mimo. A figura paterna mais presente, embora não fosse o suficiente para ofuscar a imagem de seu pai. O senhor de meia idade era o responsável por acompanhar a garota por todos os lados, fazendo seus desejos nesse meio tempo.

E, também, havia uma avó. Era ela a responsável pela educação de Ashtar e por colocá-la na linha. Quando mais nova, tinha medo da matriarca Yuki e, ao crescer, aprendeu que para deixá-la satisfeita, apenas bastar fazer as coisas da maneira dela — e ser o mais perfeita e impecável possível.

Seus avós tinham deixado a vida shinobi para trás ainda na juventude, assim como seu pai. Apesar de fazerem parte de um clã ninja muito tradicional do País da Água, acabaram se interessando mais em expandir as riquezas da família. Embora não tivessem conseguido afastar o irmão gêmeo da vida ninja, a própria Ashtar jamais tinha sido treinada em sua infância e, os planos de sua família para com ela era um bom casamento quando atingisse a idade ideal.

Entretanto, seu pai não viveu o suficiente para lhe ver sequer noivar.  Quando tinha nove anos, sua residência foi atacada por shinobis de filiação desconhecida. Foi um ataque silencioso e rápido; seu pai apenas teve tempo de escondê-la em um armário antes de morrer. Ashtar assistiu toda a cena de onde estava.

Com o falecimento de seu único herdeiro e, com netos jovens demais para assumir os negócios, seus avós voltaram a trabalhar. Ashtar, mesmo criança, foi prometida em casamento a um rapaz de uma família amiga e próspera, para evitar a ruína dos Yuki. Em contrapartida, a garota cismou que apenas se casaria com a permissão dos avós para ingressar na academia ninja — algo que foi muito debatido, uma vez que ambos os anciãos eram contra.

Mas Ashtar conseguiu o que queria, como sempre. Começou a frequentar a academia com o irmão, contudo, não gostava de aprender e sempre fugia para cochilar pelos cantos da vila; queria proteger pessoas, para que não acabassem como seu pai, ou desaparecessem como sua mãe, porém, não sentia que aquela era sua vocação. Tinha sido criada para ser uma princesa, e não um soldado.

Eventualmente, passou a gostar da ideia de ser uma kunoichi, apesar de jamais dizer isso em voz alta. E passou a treinar muito. O dobro, às vezes o triplo, para recuperar o tempo perdido. Vivia competindo com seu irmão, mas nunca o vencia. Queria ser uma ninja ao menos razoável. Porém, dependente de sua dedicação aos estudos, a graduação demorou um pouco, afinal, ninguém sabia dizer se a garota era desinteressada ou apenas desligada.

Quando finalmente se tornou uma ninja, realizava o máximo de missões, mesmo as mais estúpidas, sem reclamar e, ficou claro que sua aparência sempre distraída não condizia com suas habilidades, radicalmente polidas pelos treinos intensos. Mais uma vez, estava se tornando sua melhor versão.