Aquela viagem era notavelmente uma aventura fabulosa no olhar de uma criança, atravessar o grande deserto enquanto enfrentavam o quente clima do dia e o frio soturno presente durante a gélida noite era uma prova de resistência para qualquer um; enfrentar a mudança de clima seco e desértico para um mais tropical era um verdadeiro alívio e um deleite - podendo ser considerado até mesmo uma trégua na batalha entre homem e o ambiente -, as grandes florestas escondiam segredos que faziam o olhar da criança da Lua brilhar a cada instante em que devaneava com a gama de possíveis mitos e fábulas presentes naquele local que poderia ser considerado tanto inóspito quanto benevolente.


O Ishikawa parecia tenso e até mesmo desconfortável enquanto naquela imensidão, o serviço acabara se tornando um tanto quanto melindroso, mas ele soube aproveitar as belezas naturais que tanto faziam seus olhos brilharem. Era notável que havia alguém acompanhando Aru nessa viagem e em sua ida ao grande comércio; era uma criança que aparentava estar na casa dos cinco ou seis anos, ela agarrava a mão do outro sunense com as suas duas e mantinha-se quase que se escondendo atrás do corpo do mesmo por conta de sua timidez e medo de acabar se perdendo daquele que parecia ser seu guardião.

Pequeno e de corpo magro, a criança da Lua era possuidor de grandes cabelos negros e emaranhandos que desciam até um pouco abaixo de sua cintura. Trajado em uma simples túnica turquesa já um pouco suja e batida por conta da viagem, o pequeno garoto ou garota - era extremamente difícil de identificar o sexo do mesmo devido sua aparência e suas roupas - não trazia em seus pés nenhum tipo de calçado. Seus grandes olhos castanhos e curiosos olhavam tudo ao redor com extrema fascinação pelo novo, digno da pureza característica de uma criança.

Enquanto transfigurado, Shüra - ou melhor, Moonlight como ordenou em ser chamado quando necessário - observava cada pessoa presente naquele local e seus costumes, além também de entender o comércio local daquele vilarejo. Obviamente sua presença junto a Aru nesta viagem não era simplesmente lazer, tinha muito o que gostaria de ver e muito o que pensar enquanto visualizava tudo através dos olhos de criança, longe de qualquer suspeita.

Seu companheiro e classificado como seu guardião - enquanto na aparência de um ser quase tão indefeso quanto uma pequena lebre - avistou um restaurante onde tinha como característica a presença de diversos pequenos felinos domésticos, para alguém como Aru era óbvio que aquilo lhe enchia de alegria e leveza, entretanto o Hachidaime não sentia a mesma felicidade que seu conterrâneo, mas era óbvio que a atmosfera lhe era agradável por conta de sua pacificidade e tranquilidade.

Enquanto Ishikawa tomou assento, Moonlight puxou levemente um pouco sua mão e apontando para os gatinhos pediu permissão para seu guardião com os olhos brilhantes para que pudesse brincar com os animais. Enquanto na forma de criança, Shüra adotou uma postura onde não dizia sequer uma palavra em público, isso o tornava ainda mais incapacitado e indefeso aos olhos alheios e tirava de si qualquer atenção desnecessária que fosse. Tendo ganho a autorização de Aru, ele dispararia em correr atrás daqueles pequenos felinos enquanto puxava o rabo deles, digno de uma boba criança arteira repleta de energia, curiosidade e felicidade.

Tudo era amigável e extremamente benevolente naquele estabelecimento; uma harmonia perfeita com a figura da criança, porém um contraste extremo com a personalidade de Shüra.

Aru desempenhava seu papel formidavelmente, era notável seu grande esforço para com o disfarce do Kazekage e isso o agradava imensamente. Em um chamado cortês vindo da parte de seu atual guardião, Moonlight buscou se limitar apenas em apontar com seus pequenos dedos o que desejava consumir, sendo eles: um mochi de tamanho médio e um pouco de Sakurayu.

A criança parecia extremamente contente com seu pedido e seus olhos logo se fixaram no que viria a saciar a sua terrível fome que neste ponto da viagem o amargava o âmago. Não poderia sequer dar a primeira provada no bolinho de arroz e/ou acalmar seu paladar com a deliciosa bebida de flores de cerejeira, Aru o havia advertido sobre possíveis ladrões que o perseguiam desde a saída de ambos do mercado. Ele ouviu atentamente cada palavra de Ishikawa e sinalizou com a cabeça que havia compreendido a situação, levando em seguida seus lábios rachados até a borda do copo enquanto o envolvia com ambas as mãos.

Era hora de partir e consequentemente teriam que provavelmente lidar com aqueles que estavam em seu encalço. Mantendo a sua postura infantil e indefesa, Moonlight se despediu calorosamente daquele que lhe serviu, assim como também dos pequenos felinos que o distraíam durante a rápida pausa no estabelecimento.

A dupla seguiu lado a lado até se afastarem um pouco e sob comando do Kazekage, ambos dobraram em um beco que acabou se revelando completamente sem saída. Antes mesmo que Aru pudesse dar meia volta, os dois brutamontes fecharam a entrada por onde a dupla viera e um logo se prontificou a agarrar a pequena criança. — É sempre um prazer ter turistas aqui conosco na Folha! — Eles riram alto em um ritmo desajeitado que os faziam parecer porcos grunhindo no lamaçal. — Apesar dessa criança parecer uma mulamba, o senhor não me engana! Deve ser podre de rico e nós o vimos esbanjando sua fortuna comprando as mais diversas especiarias. — O que falava puxou uma pequena adaga e levou ela até a garganta de Shüra que estava imóvel pelos braços do outro e tinha sua boca tampada pela grande mão deste. — Vamos lá seu desgraçado, me dê tudo que tem se não eu fatio o pirralho!

O fato de estar sendo usado como refém não condizia com o Kazekage, mas permitiu permanecer assim pelo fato de ser o melhor a se fazer, afinal estava em uma vila inimiga e temia que realizar qualquer demonstração de seu chakra pudesse chamar atenção desnecessária para a dupla vinda da Areia, além de ser uma boa maneira de ver como Ishikawa iria lidar com a situação.

A serenidade estava completamente estampada nos olhos e na fisionomia da pequena criança que era usada como refém. Sentia-se envergonhado e até mesmo enojado de ter assumido tal posição, mas Shüra sabia que talvez fosse o melhor a se fazer naquele instante. A mão grande, grosseira e machucada daquele que o tinha tomado em seus braços pressionava seus lábios com uma grande força, sufocando levemente o pulcro e dificultando sua respiração.

Ambos os trogloditas festejavam por terem encontrado “presas” tão fáceis quanto aqueles dois: um jovem estrangeiro de aparência delicada detentor de uma possível fortuna herdada de uma família rica e uma criança indefesa de fisionomia pobre e órfão; de fato aquilo seria motivo para ambos encherem os olhos de lágrimas de alegrias e gozarem do destino que agora os banhavam em um mar de sorte inesperada.

Como diria aquele velho ditado popular: “Felicidade de pobre dura pouco”, aqueles dois homens infelizes se viriam diante de uma grande virada de chave ao momento que Ishikawa demonstrou ser extremamente hábil em uma das três grandes vertentes do poder shinobi. O medo tomou conta de ambos, tomando completamente o lugar do sentimento de felicidade que sentiam anteriormente; aqueles dois criminosos já tinham certeza de que não estavam em um mar de sorte inesperada, mas sim se viam atravessando um portal que o levariam a um destino frio, cruel e desolador que todo homem busca fugir a vida toda: a morte. Soltaram Moonlight rapidamente e partiram rapidamente em meio a tropeços e desespero daquele beco, liberando a passagem para a dupla de Sunagakure.

Aru tomou a mão da Sombra e ambos partiram rumo ao portão da Folha, já não tinham mais o que fazer lá. — Você se saiu muito bem, senhor Ishikawa. Agradeço imensamente por me trazer ao seu lado e adotar meu papel de guardião enquanto transfigurado nessa aparência, certamente consegui o que buscava. — A dupla já não estava mais dentro dos limites daquelas grandes muralhas - não tão grandes e belas quanto a de Sunagakure - e seguiam pela estrada principal a fim de retornar para casa. O Kazekage olhou por cima de seu ombro e avistou a Folha aos poucos desaparecer no horizonte. Eu vingarei Treze, Konoha.