“Ei, você não é o encantador de insetos?”, um garoto me indagou, o catarro escorrendo do nariz até a boca. “Me lembro de você outro dia, veio aqui me assustou com os besouros embaixo da mesa! Você estava vestido de palhaço”, nossa, outro dia? Esse garoto parecia ter crescido um bocado e pra tenho quase certeza que já havia se passado quase um ano.

Eu sabia que andar pela academia ninja me traria várias lembranças tão saudosas que quase doem, essa sensação nostálgica que custa sair do peito. Não achei que seria tão rápido e fácil, no entanto, que gatilhos tão fortes em minha mente fossem ativados pelo simples perguntar de uma criança. Ele tinha razão, eu era o encantador de insetos que havia chegado aqui com um nariz de palhaço e, como forma de ganhar o respeito da sala, coloquei insetos debaixo da mesa do engraçadinho e depois de me exibir um pouco manipulando-os pela sala, fiz um grande discurso sobre ninjas terem habilidades diferentes e que não era legal zoar um companheiro. Teatral, não acha? Era uma missão de rank D, e delas, sinceramente, não sinto falta. Gosto de como a vida é hoje, afinal com o nariz vermelho ou não eu sei que sou muito foda pra perder tempo com tarefas simples.

— É assim que tem me chamado, então? — Sorri, não precisava agachar pois o garoto de bochechas rechonchudas já era quase do meu tamanho. Ele devia ter o quê? Nove anos agora? Por vezes, algumas pessoas me cumprimentavam na rua e até me perguntavam sobre como havia sido a guerra em que o Hokage morreu. Eu ainda não havia me acostumado com isso, obviamente, mas no cenário em que o garoto realmente havia me conhecido antes disso era algo bom — Me desculpe por aquele dia. Os kikaichuu nunca te fariam mal, eles me obedecem apenas pra atacar o inimigo. Qual o seu nome mesmo, garotinho?

— É Rikuji. E não tem problema… Eu acho que mereci — Ele coçou a nuca. Seus cabelos eram roxos em brilhantes em raros tons de fim-de-tarde. Havia deixado com que crescessem desde nosso último encontro e os fios agora já caíam sobre os ombros — Sabe… suas palavras fizeram muito sentido pra mim naquele dia. Acho que eu só quis curtir com a sua cara pra esconder minhas próprias inseguranças. Daí, ver você com o nariz de palhaço sem ligar pro que os outros pensavam… Bom, meio que me fez querer ser forte para aceitar quem eu sou agora.

Isso era bom, certo? Sobre o que ele estava querendo dizer? Talvez, pela minha cara de desentendido, ele tenha achado melhor já esclarecer quaisquer dúvidas.

— É que… Bom, eu sou de um clã antigo, honrado e tradicional, mas eu gosto de parecer uma menina, sinto que gosto de brincar mais com elas e meu sonho sempre foi conseguir criar jutsus de borboletas assim como minha irmã quando eu conseguir usar ninjutsu — Por incrível que pareça, o garoto não parecia constrangido, continuando a me contar sobre sua vida, sem ressalvas — Sempre tive medo do meu pai, então nunca havia nem mesmo tentado treinar o jutsu das borboletas… Mas então eu criei coragem e mostrei que um ninja pode ser bom em coisas diferentes, assim como você disse.

— Nossa, Rikuji… Isso é… ótimo, né? Espero que você não tenha adquirido problemas com isso — Na verdade, eu é quem estava desconcertado. Tinha defesas e estratégias contra os piores inimigos, mas me sentia um imbecil quando os assuntos eram esses. Ainda mais com uma criança — Me compadeço com a sua luta, e se quer saber, embora eu não saiba muito sobre essa situação só sei que a vida vale a pena apenas se você for você mesmo, seguir suas próprias vontades, ou você vai acabar morrendo e percebendo no fim que você só fez a vontade dos outros e… Bom, isso não vale a pena.

— Ah, sim! Na verdade… O meu pai foi bem compreensivo e disse que eu poderia treinar o jutsu que quisesse desde que eles fossem fortes — Sim, que bom que o pai do garoto era assim, ou realmente eu me sentiria muito mal agora — Você não precisa ir pra aula? Eu preciso falar com o Iraku-sensei.

— Sim, é aula de shurikenjutsu agora! Eu sou péssimo, mas preciso realmente ir — O garoto fez cortesia como se agradecesse algo e apontou para onde Iraku, o diretor daquela academia provavelmente estaria.

Agora, o nostálgico lugar com risadas de crianças e sons de treinos leves me sugavam até minha própria experiência como aluno ali. Era uma criança deslocada, ainda entendendo sobre o mundo. Usava maquiagens de palhaço e embora tentasse, não consegui grandes amigos. Mas não costumava ficar pregando peças ou sentado chorando num banquinho preso na árvore ouvindo uma flauta triste. Se não queriam me aceitar, então tinham que me vencer. Esse é o lema até hoje, certo?

— Vejam só, dizem por aí que você tem se tornado um ninja exemplar, Treze. Fico muito orgulhoso — E esse cara foi um dos que sempre me apoiou. Acreditava em mim e disse que gostava da minha mente criativa, esse mesmo que me recebia de braços abertos em sua escola de ninjas — Veja só você não está até mais robusto, antes era só um magrelo sem constituição nenhuma.

Ele deu uma risada, passando a mão em meus cabelos. Perto dele, me lembrava da criança que eu ainda era devido a sua altura.

— Sai fora, sensei — Dei uma risada, saindo de sua área de toque em meu cabelo — Aposto que hoje em dia eu já sou mais forte que você. Não, eu estou enganado. Eu já era mais forte de você quando ainda estudava aqui.

Um “x” em sua testa subiu, sua face ficando vermelha rapidamente. Então ele me aplicou uma chave de pescoço e com a mão livre afundou o osso do indicador no topo da minha cabeça. Sob meus protestos de “para! para! para” e os olhares de algumas crianças que se assustaram com a cena, o homem finalmente me soltou e deu algumas risadas, pedindo para que as crianças continuassem como se nada estivesse acontecendo. No fim, no portão de entrada daquele lugar, apliquei o selo da minha técnica. Se eu quisesse proteger a vila, com certeza ali seria um local importante de se poder deslocar rapidamente. Afinal, Iraku-sensei, as crianças, não eram todas a maior engrenagem do futuro da vila?